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Conto premiado no evento: VII
Concurso Prosa e Verso Jornalista Tobias Granja, na categoria Prosa;
realizado pela Academia Palmeirense de Letras - APALCA; em 2016 a
classificação foi: 2º Lugar.
Eu matei Maria-lencinho! Escorreu
sobre minha mão a única gota de sangue que compunha seu corpo pequeno! Ela era
tão fofinha, quase toda branquinha e cantante e parecia tão frágil, que um
vento revoltado poderia a derrubar sobre o solo, senão matá-la! Mas não foi um
vento que a consumiu, foi o peso da minha mão e a falta de oportunidade sobre a
minha vida; foi minha cabeça pouco pensante, meu espírito incomum! Foi uma bola
forjada no chão e conduzida por uma arma artesanal, arranjada por mim, que a
atingiu no peito!
Martelava sobre minha cabeça,
memórias, as mais diversas de que as pessoas, quando a viam, pulsante, pronunciavam:
- lá vem a Maria-lencinho, contente e
cantante! De felicidade ela açoitava os braços, como se fossem asas de
passarinho alegre! Quando não, outros diziam: - pobrezinha, de tão frágil, que parece só ter uma voz a sustentá-la, se
perdê-la, morrerá também! - vejam se
não é a Pombinho-das-almas! Diziam, por fim.
Expunha um excêntrico: - medonha, por fim, se não, não carregava
sobre as costas essa capa negra noutras vezes marrom... Se não fosse assim
perdurava na vida, sem morrer, porque o sombrio é sinônimo de treva e de dor, de
castigo e de morte!
- Nada
disso! Arrebatou outra pessoa e continuou: - Se assim fosse: uma cor definir o que sou ou deixo de ser, nossa
liberdade estaria comprometida! Maria-lencinho, seria então, uma mistura de
dons e ternuras, de nefastos comportamentos e de promessas de morte! - Mas Maria-lencinho é terna, é saudosa, é
projetista e exala perfume e melodia inigualáveis; Maria-lencinho é um anjo,
uma bênção de ser vivo!
- Mas
eu a matei! Está aqui na beira da estrada jogada, nem velório e nem cova eu lhe
ofereci! Disse eu desconsolado.
- Isso
é um mundo de loucos, meu senhor? Falam da morte como se falassem de uma fruta
que caiu do pé! Maria-lencinho, eu sei, andava como quem voa, o lenço esvoaçava
como duas asas de passarinho e o canto era incisivo, ao mesmo tempo, suave e
único!
- Do
que falas e desdenhas, afinal, infame? Indagou Manasés Sertanejo.
- Uma
bala eu lancei sobre a sua fronte e a
atingi... Foi sem querer! Quando a peguei em minhas mãos, esvoaçava o lenço e a
saia negrita em leque, arrastava-se sobre o chão, como se em despedida
mesquinha!
- Vós
fostes cruel; demais satânico menino! Julgou-me outra senhora e acrescentou
mais: - a morte dela nada conta na tua
vida, só subtrai; porque nada podes aproveitar dela em sepulcro: nem a maioria
das vestes plumadas e branquinhas, nem a capa negra, o lenço bem menos e a saia
turva, em leque; bem menos o canto que se apagará de nossa memória e o “talarido”
singular; ela não mais fará festa ao ver seu companheiro (ainda mais branco com
as costas mais negras) e não produzirá nada para as gerações vindouras! Vós
matastes uma promessa de vida boa e feliz!
- Eu
sei! Balancei a cabeça e disse mais: – o
sangue pequeno e pouco quente que fiz jorrar do seu corpito me manchou desde a
pele até minha alma medonha!
E quando cheguei a minha casa, minha
mãe fez aumentar ainda mais o meu sofrer:
- Por
que matastes a bichinha? Um passarinho que não faz mal a ninguém, só nos
acompanha nos dias de lavar as roupas, no barreiro, senão perto de nossas
casas! A Senhora Mãe de Deus te castigará! Tu sabes da lenda, da tradição:
Maria-lencinho foi quem lavou as vestes de Maria, quando se sujaram com o
sangue do seu Filho Jesus, O Crucificado! Tu te preparas meu filho!
- Ela
incidirá tormentos e castigos sobre minha maldita vida, mãe? Perguntei
amedrontado.
- Mas
é claro que não! A Mãe não é vingativa; ela apenas retirará as mãos da tua
cabeça e recolherá seu manto sagrado... Isso te baste como uma morte anunciada,
porque a proteção da Mãe se afastará de ti até que mereças o perdão!
JaloNunes.
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