DESCANSO PARA LOUCURA: novembro 2017

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segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Cenáculo Mariano 2017, em Palmeira dos Índios/AL: panfleto e vídeo de divulgação

Saiu o panfleto de divulgação do Cenáculo Mariano 2017 em Palmeira dos Índios/AL, com o tema: Maria, plena de Deus nos leva a Jesus.
O evento ocorrerá nos dias 7 e 8 de dezembro do corrente ano, no Estádio Municipal Juca Sampaio e terá como atração musical o show do grupo Ministério Adoração e Vida.


Veja o vídeo convidativo de Ministério Adoração e Vida:

terça-feira, 21 de novembro de 2017

Barra do Ipanema e Rio São Francisco - Alagoas, Brasil

Barra do Ipanema é um vilarejo às margens do Rio São Francisco, pertencente ao Município de Belo Monte/AL. Nosso destino saia de carro, do agreste do Estado de Alagoas (Palmeira dos Índios) até Barra do Ipanema (são pouco mais de 110 km). Nesse percurso temos pelo caminho, dentre os principais pontos de referência): Estrela de Alagoas e Cacimbinhas (BR 316); Major Izidoro (AL 120) e Batalha (AL 220). E a partir da saída de Batalha/AL pega-se uma estrada de terra, num percurso entre 40 a 50 minutos até a beira do Rio São Francisco e seus encantos, os mais belos e prestigiosos.

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Fichamento: A Educação em Mészáros: trabalho, alienação e emancipação, de Caio Antunes

ANTUNES, Caio. A educação em Mészáros: trabalho, alienação e emancipação. Campinas, SP: Autores Associados, 2012. (Coleção educação contemporânea).


INTRODUÇÃO

“Istvan Mészáros nasceu em Budapeste, Hungria, no dia 19 de dezembro de 1930. Os primeiros anos de sua vida foram muito difíceis, ao coincidirem, por outro lado, com a grande crise de 1929-1930 e suas consequências, e, por outro, com anos anteriores à Segunda Guerra Mundial” (ANTUNES, 2012, p. 1).
“Autor de vasta obra e lido em vários países, István Meszáros vive hoje na Inglaterra, encontra-se em plena atividade intelectual e desenvolve intensa militância em diversos países do mundo, sobretudo na América Latina – com especial destaque para Brasil e Venezuela” (ANTUNES, 2012, p. 2).
“Ainda assim, Mészáros pode ser considerado um autor relativamente pouco conhecido da pesquisa educacional brasileira. No entanto, não se trata de um ‘ilustre desconhecido’, muito até ao contrário disso, uma vez que seu A educação para além do capital (2005) tornou-se muito rapidamente um clássico do pensamento educacional emancipatório no Brasil (e no mundo)” (ANTUNES, 2012, p. 2).
“No interior do marxismo, Mészáros filia-se à tradição do pensamento iniciada por Lukács – de quem foi, aliás, além de aluno e assistente, amigo próximo -, especialmente nas concepções lukacsianas da estética e da ontologia. Seu pensamento muito tem contribuído para o avanço e a atualização da filosofia e das ciências sociais, por meio da formulação de um fecundo, crítico e original conjunto de categorias analíticas” (ANTUNES, 2012, p. 2).
Crise estrutural do capital significa, portanto, que, pela primeira vez na história, o sistema sociometabólico vigente ‘confronta-se globalmente com seus próprios problemas’ (...), e que qualquer tentativa de resolução de tais problemas dentro dos limites do capital aproxima a humanidade de sua real possibilidade de destruição, tanto no plano ecológico quanto no plano militar” (ANTUNES, 2012, p. 4).
“Com base, então, na noção de trabalho, conforme formulada por Marx em seus Manuscritos econômico-filosóficos, Mészáros desenvolve sua teoria da alienação, no interior da qual aponta e discute as profundas imbricações e desdobramentos da forma alienada de atividade vital humana às mais variadas esferas da vida cotidiana dos seres, desde os aspectos econômicos até os políticos, dos aspectos morais aos estéticos, que, obviamente, afetam profundamente todo o processo de constituição, formação, de educação dos seres humanos. Essas formulações são desenvolvidas por Mészáros em seu A Teoria da Alienação em Marx (2006ª) e deve-se a isso o fato de essa obra ocupar lugar central em nossas análises” (ANTUNES, 2012, p. 6).
“Talvez por conta disso, a possível contribuição deste trabalho esteja em aproximar de professores e professoras, pesquisadores e pesquisadoras do campo da educação a grande – grandiosa – propositura emancipatória que permeia a obra – e a vida – de István Mészáros” (ANTUNES, 2012, p. 8).

Capítulo 1: Trabalho, alienação e educação

1 – O trabalho como elemento fundante do ser humano

“Dizer que o ser humano precisa produzir para se manter (alimentar-se, vestir-se, habitar, enfim, manter-se vivo, reproduzir-se) significa afirmar que a atividade produtiva constitui algo ineliminável do próprio processo de manutenção da humanidade. Dito de ouro modo: a atividade produtiva é o fator absoluto de todo o processo de produção e reprodução da vida humana – ‘absoluto porque o modo de existência humano é inconcebível sem as transformações da natureza, realizadas pela atividade produtiva’” (ANTUNES, 2012, p. 10).
“Consequentemente, o ser natural humano tem de fazer adequados, isto é, humanos, os objetos de suas necessidades, tem de transformar a natureza por meio de sua atividade produtiva, tem de humanizá-la por meio de seu trabalho (...)”(ANTUNES, 2012, p. 11).
“Isto que Marx chama de natureza como’ corpo inorgânico’ do ser humano, muito além de significar somente aquilo que é imediatamente dado pela natureza, significa algo inerentemente histórico e material: isto é, a capacidade humana de fazer da ‘natureza inteira o seu corpo inorgânico’ – ou, conforme a explicação Mészáros (2003ª, p. 80), o ‘corpo inorgânico’ do ser humano é a ‘natureza trabalhada’ e a capacidade produtiva externalizada, ou, ‘a expressão concreta e a materialização de uma fase e uma estrutura historicamente dadas da atividade produtiva, na forma de seus produtos, dos bens materiais às obras de arte” (ANTUNES, 2012, p. 11).
“Entretanto, mesmo e por mais que deixe de ser imediatamente um ser natural, ‘o ser social – em seu conjunto e em cada um de seus processos singulares – pressupõe o ser da natureza inorgânica e orgânica’ (LUKACS, 1979, p. 17), o que significa que ‘não se pode considerar o ser social como independente do ser da natureza, como antíteses que se excluem” (ANTUNES, 2012, p. 12).
“É exatamente o trabalho esse poder humano por excelência – ‘poderes essenciais do homem são as características e poderes específicos humanos, isto é, aqueles que distinguem o homem das outras partes da natureza’” (ANTUNES, 2012, p. 12).
“Findo então esse processo, o ser humano se depara com algo não mais imediatamente dado pela natureza, mas algo transformado pelo trabalho, algo humanizado. Ou seja: no final do processo de trabalho, o trabalhador se defronta com o resultado de sua ação; com a natureza feita humana; consigo próprio na forma de objeto; com sua subjetividade objetivada” (ANTUNES, 2012, p. 14).
“Se, então, as generalizações feitas a partir das experiências do trabalho trazem em si a gênese da ciência, ou, ainda, se ‘a estrutura da produção científica é basicamente a mesma da atividade produtiva fundamental em geral (principalmente porque as duas se fundem em grande medida)’, o que não é outra coisa senão afirmar que ‘as atividades e necessidades humanas de tipo ‘espiritual’ têm, assim, sua base ontológica última na esfera da produção material como expressões específicas de intercâmbio entre o ser humano e a natureza, mediado de formas e maneiras complexas’, é exatamente o acúmulo sócio-histórico dos avanços do trabalho, tanto em suas formas imediatamente materiais quanto nas mais complexas e abstratas manifestações espirituais – da arte à filosofia – que constitui o cerne de todo o processo formativo, educacional da humanidade” (ANTUNES, 2012, p. 16).
“Entretanto, do ponto de vista histórico, também não é possível conceber trabalho sem educação, pois, como bem sabemos, ‘os homens fazem sua própria história; contudo, não a fazem de livre e espontânea vontade, pois não são eles quem escolhem as circunstâncias sob as quais ela é feita, mas estas lhe foram transmitidas assim como se encontram’” (ANTUNES, 2012, p. 17).
“Inicialmente, a relação do homem com a natureza – que é mediada pelo trabalho – é sim a relação da natureza consigo própria, ou aquilo que Marx chama, de modo bastante obscuro, aliás, de ‘o ser-por-si-mesmo da natureza’. Todavia, recordemo-nos aqui que o ser humano não é apenas um ser natural, mas ser natural humano – isto é, histórico, social. Isso implica que ele é sim ‘uma parte da natureza’, mas é dela uma parte específica, cuja especificidade é dada exatamente pelo trabalho” (ANTUNES, 2012, p. 18).
“Esse ‘salto ontológico’ deve-se, então, exatamente a esse caráter ‘transicional’ do trabalho – isto é, ao fato de ser o trabalho uma categoria intermediária entre o ser biológico e o ser social. O que não é outra coisa senão que o trabalho é o elemento ontologicamente fundante do ser humano – ou social – ou a ‘base dinâmico-estruturante de um novo tipo de ser’, e que, precisamente por conta disso, converte-se, conforme outra bela síntese lukacsiana ‘em modelo de toda práxis social’” (ANTUNES, 2012, p. 20).
“Em síntese, então, temos que pelo ato de trabalho o ser humano se humaniza; ou seja, a natureza (ou uma parte específica dela) transcende a si própria por meio do ato laborativo. Essa realização humana é aquilo que Marx chama de – também de modo bastante obscuro – ‘o movimento concebido e sabido do seu vir a ser’, ou ‘ato de gênese que se suprassume, e que Mészáros chama – de modo não menos obscuro – de ‘autoconstituição automediadoramente natural’ ou ‘naturalmente automediadora’ do homem” (ANTUNES, 2012, p. 21).
“Assim o trabalho, o mediador da relação entre ser humano e natureza, tanto em seu aspecto estrutural quanto em suas formas históricas, tanto como elemento fundante quanto como processo de continuidade e complexificação, tanto em sua profundidade analítica quanto em suas manifestações práticas, numa palavra, o trabalho em seu sentido ontológico, é aquilo que Mészáros chama de conjunto ou sistema de mediações primárias ou mediações de primeira ordem” (ANTUNES, 2012, p. 25).
“Somente a partir de uma apreensão amplo do trabalho é que se pode compreender as razões pelas quais este configura tanto a causa, quanto o meio e o fim do processo histórico-social do ser humano – causa da diferenciação entre ser humano e natureza, meio de constante humanização do ser social e fim, ou finalidade em si do próprio processo humano, uma vez que o ser social, em virtude do longo processo histórico já trilhado, não mais produz para assegurar sua condição animal, mas sim para, uma vez assegurada essa sobrevivência, desenvolver-se livre, isto é, humanamente” (ANTUNES, 2012, p. 25).
“Essa é a razão pela qual o trabalho é tanto o ponto de partida quanto o ponto de chegada da concepção de educação em Mészáros – na verdade de sua concepção como um todo -, pois se o trabalho é exatamente aquilo que garante a reprodução social diária e imediata, é também aquilo que torna possível ao ser humano, ao conjunto dos seres humanos, a partir de assegurada a supressão das carências e necessidades básicas, dedicar-se a atividades que possibilitem uma existência cada vez mais plena, cada vez mais humana” (ANTUNES, 2012, p. 25).
“Se, por um lado, é o acúmulo sócio-histórico das realizações e aquisições dos processos de trabalho que constitui o cerne de todo o processo formativo humano – o que significa que cada nova geração não precisa redescobrir o fogo, ou reinventar a roda – por outro, é exatamente esse processo formativo, educacional, que torna possível que os seres humanos possam conduzir sua existência de modo cada vez mais humano, pelo menos potencialmente” (ANTUNES, 2012, p. 25).
“Assim, o conceito de alienação é absolutamente crucial para a compreensão da concepção de educação em Mészáros, em vista do fato de, por um lado, ser a superação da alienação do trabalho uma condição sine qua non do processo de emancipação humana; e de, por outro, este processo de superação ser caracterizado como ‘uma tarefa inevitavelmente educacional’” (ANTUNES, 2012, p. 27).

2 – A teoria da alienação de Marx na acepção de Mészáros
                                                                                                                                                                      
“Agora, se ao final do processo de trabalho o obejeto produzido não mais pertence ao ser humano que o produziu, que o objetivou, isto é, dele se aliena, pertence a um outro ser humano, isto decorre de características específicas da forma como se organiza e se realiza o trabalho num dado momento histórico, e não se uma suposta condição absoluta – natural ou divina – do processo de trabalho em si. Sob o capital, ‘os valores-de-uso são, ao mesmo tempo, os veículos materiais do valor-de-troca’” (ANTUNES, 2012, p. 29).
“Se alienação é, então, uma característica histórica do processo de trabalho, ou para ser um pouco mais preciso, da forma como se organiza o trabalho num dado momento histórico, tem-se então que alienação é um conceito, em si, inerentemente histórico. Em razão disso, ‘alienação é um conceito inerentemente dinâmico: um conceito que necessariamente implica mudança’, tendo, por isso de ser explicado nos seguintes termos: ‘se o homem é alienado, ele deve ser alienado com relação a alguma coisa, como resultado de certas causas – o jogo mútuo dos acontecimentos e circunstâncias em relação ao homem como sujeito dessa alienação – que se manifestam num contexto histórico’” (ANTUNES, 2012, p. 29).
“Então, toda e qualquer tentativa de compreensão da problemática da alienação deve partir da constatação prática de que, por um lado, todo processo histórico está necessariamente sujeito a transformações, tanto fenomênicas quanto estruturais – e nem por isso mais perceptíveis -, que diretamente influem sobre toda a apreensão do complexo analisado. Por outro, se a alienação é algo que se dirige ao trabalho – e este configura o ‘modelo de toda práxis social’, ‘base dinâmico-estruturante de um novo tipo de ser’ – logo, a alienação afeta, em maior ou menor grau, todas as esferas da vida cotidiana dos seres humanos, desde seus aspectos mais coletivos até os mais privados” (ANTUNES, 2012, p. 29).
“De início, então, a alienação deve ser entendida como tudo aquilo que historicamente obstaculiza a relação de mediação direta que se estabelece entre ser humano e natureza, como tudo aquilo que se interpõe nesta relação” (ANTUNES, 2012, p. 30).
“Assim, se o ‘objeto (Gegenstand) que o trabalho produz, o seu produto, se lhe defronta como um ser estranho, como um poder independente do produtor’ – o que significa, além e por conta do caráter alienado da relação que aí se estabelece, que o trabalhador não se reconhece naquilo que é o objeto do seu trabalho -, isso decorre do fato de o ser humano já não se reconhecer no ato mesmo da produção” (ANTUNES, 2012, p. 32).
O primeiro aspecto é que “(...) o ser humano é alienado de seu ser genérico, o que significa que ele não se reconhece como membro de uma espécie, uma vez que ele não se reconhece em seu trabalho, exatamente  naquilo que faz dele um ser humano e, portanto, o distingue de outras espécies de animais” (ANTUNES, 2012, p. 32).
“O segundo aspecto é que o ser humano é alienado dos outros seres humanos, pois ao relacionar-se de forma alienada com o resultado de seu trabalho, ele relaciona-se com o produto do seu trabalho (ou seja, relaciona-se consigo próprio na forma de um objeto) como com um outro ser humano diferente dele, hostil a ele” (ANTUNES, 2012, p. 33).
“Assim, ‘o ponto de convergência dos aspectos heterogênios da alienação é a noção de trabalho. Dito de modo inverso: a alienação do trabalho é ‘a raiz causal de todo o complexo de alienações’, ‘a causa última de todas as formas de alienação’ – causa daquilo que Marx chama de ‘estranhamento-de-si humano’ e que Mészáros chama ‘autoalienação humana’” (ANTUNES, 2012, p. 34).
“Isso traz à tona o fato de que o capital, para existir, necessita de algo além de si próprio e a si subordinado: para existir, o capital necessita do trabalho, da classe trabalhadora” (ANTUNES, 2012, p. 42).
“Se desdobrarmos a questão para a educação, a resposta varia em termos epistemológicos, mas, ontologicamente, a resposta se mantém. Ou seja: se a dominação do capital configura a universalização de uma parcialidade de classe, e se ‘as determinações gerais do capital afetem profundamente cada âmbito particular com alguma influência na educação’, o projeto burguês de educação, com seu mecanismo formativo, não poderia ter outro objetivo senão o da própria perpetuação do capital” (ANTUNES, 2012, p. 42).
“Por conta disso, se era – como é – completamente imprescindível ao capital a universalização de um projeto de educação, tanto em relação aos aspectos formativos estritos quanto em seus aspectos amplos – isto é: ‘a produção das qualificações necessárias ao funcionamento da economia e [...] a formação dos quadros e a elaboração dos métodos de controle político’ -, não se deve perder de vista a orientação estrutural deste projeto, razão pela qual os princípios da educação moderna (leia-se burguesa) derivados do princípio de Igualdade, Liberdade e Fraternidade, eram, e são, tão belos quanto irrealizáveis” (ANTUNES, 2012, p. 42).
“Exatamente em razão disso, tomar como bandeira da luta socialista pela educação a universalização do ideal de educação burguesa implica num movimento circular necessariamente autoderrotista, por duas grandes razões: a primeira delas se pauta no argumento de que nos chamados países dependentes não houve a implantação plena do projeto burguês, de que o que houve foi um arremedo desse projeto. Esse argumento perde de vista que este arremedo é exatamente o projeto burguês em sua plenitude (...). A segunda razão se sustenta no fato de que o capital se erige sobre uma insolúvel contradição: o antagonismo irreconciliável entre capital e trabalho – ou, de modo mais personificado, aquela contradição expressa no antagonismo estrutural entre o ‘sujeito produtor real [...] [e o] pseudo-sujeito usurpador’” (ANTUNES, 2012, p. 43).
“Além disso, ‘o sistema capitalista de nossa época foi privado da sanção máxima de que dispunha: a guerra total contra seus inimigos reais ou potenciais’. Portanto, o desenvolvimento histórico do capital – que em seus primórdios deu origem aos belos princípios do ideal burguês de educação – resulta, necessariamente, na eclosão de uma crise estrutural. Não se trata, obviamente, de abandonar a luta pela universalização da educação, que, aliás, é uma bandeira fundamental do movimento socialista. Trata-se, sim, de compreender o equívoco ontológico de se considerar que o ideal burguês de educação que deve estar no centro desta universalização” (ANTUNES, 2012, p. 44).

Capítulo II – Esfera política e superação da alienação: negação da negação, mediação e positividade

“Pela riqueza objetivamente desdobrada da essência humana que a riqueza da sensibilidade humana subjetiva, que um ouvido musical, um olho para a beleza da forma, em suma as fruições humanas todas se tornam sentidos capazes, sentidos que se confirmam como forças essenciais humanas” (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 55).
“Assim, sob o capital, nos deparemos com o problema da impossibilidade ontológica de realização do próprio ser humano, pois, se ‘a natureza não produz, de um lado, possuidores de dinheiro ou de mercadorias, e, de outro, meros possuidores da próprias forças de trabalho’ – são exatamente as estruturas jurídico-políticas que salvaguardam a propriedade privada dos meios de produção que mantêm o trabalho na condição de alienação e, assim, asseguram a autorreprodução do capital” (ANTUNES, 2012, p. 55).
“O cerne dessa questão é a distinção absolutamente vital ‘entre o comunismo como movimento político – o qual se encontra limitado a uma determinada fase histórica de desenvolvimento humano – e o comunismo como uma prática social abrangente’. Mas, para podermos discutir de modo adequado a articulação entre um ‘movimento político’ e ‘uma prática social abrangente’, devemos nos deter sobre uma ou outra forma de manifestação da relação que se estabelece entre negatividade e positividade, expressa nas esferas da legalidade e da moral” (ANTUNES, 2012, p. 60).
“É por conta também disso que Mészáros afirma tão enfaticamente que a ‘tarefa histórica [de transformação social qualitativa] que temos de enfrentar é incomensuravelmente maior que a negação do capitalismo’” (MÉSZÁROS, apud ANTUNES, 2012, p. 44).

Capítulo III – A educação para além do capital: educação e superação da autoalienação do trabalho

“Essa ‘e a verdadeira dimensão do problema educacional’, o que não é outra coisa senão afirmar que a ‘questão crucial, sob o domínio do capital, é assegurar que cada individuo adote como suas próprias as metas de reprodução objetivamente possíveis do sistema. Em outras palavras, no sentido verdadeiramente amplo do termo educação, trata-se de uma questão de ‘internalização’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 74).
“Aqui se chega ao ponto no qual se pode mais adequadamente compreender que educação, em Mészáros, significa algo em si profundamente articulado à existência humana, e, portanto, à totalidade dos processos sociais de produção e reprodução da vida social (...); ‘a aprendizagem é a nossa própria vida, desde a juventude até a velhice, de fato quase até a morte, ninguém passa dez horas sem nada aprender’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 74-75).
“Todavia, é preciso deixar claro que, se educação em Mészáros significa algo como ‘a nossa própria vida’, esse sentido amplo não pode ser restrito aos processos de vida de sujeitos singulares, de indivíduos tomados isoladamente, pois bem se sabe (...), ‘que os homens fazem sua própria história; contudo, não a fazem de livre e espontânea vontade, pois não são eles quem escolhem as circunstâncias sob as quais ela é feita, mas estas lhe foram transmitidas assim como se encontram (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 75).
“Essa é a razão pela qual o processo de formação dos seres humanos – numa palavra: educação – ‘é um trabalho de toda a história do mundo até aqui’” (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 76).
“Por conseguinte, sob o capital, a questão educacional centram é, obviamente, também a devida interiorização das ‘circunstâncias [...] transmitidas assim como se encontram’, com a diferença crucial de que se trata aqui somente do passado recente e estreito, isto é, do passado que está estritamente circunscrito nos limites do capital, e, ainda, somente aquele que não evidencia nenhuma de suas contradições fundamentais” (ANTUNES, 2012, p. 76).
“Isso que Mészáros chama de ‘educação contínua de pessoas’, que assegura a transmissão da herança material e espiritual do capital, ‘tem duas funções principais numa sociedade capitalista: (1) a produção das qualificações necessárias ao funcionamento da economia, e (2) a formação dos quadros e a elaboração dos métodos de controle político (...)’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 76).
“Sob a produção de mercadorias, o trabalhador deve ser reproduzido, assim como educado, somente – e no máximo – até os estreitos limites do tempo socialmente necessário’ absolutamente imperante sob o capital. Ou seja, do ponto de vista amplo, o máximo de humanidade a que o trabalhador pode e deve ter acesso é tão somente aquilo que lhe permita, do ponto de vista estrito, atingir o ‘grau médio de habilidade, destreza e rapidez reinantes na especificidade em que se aplica’ – razão pela qual ‘as carências do trabalhador são assim [...] apenas a necessidade de conservá-lo durante o trabalho, a fim de que a raça dos trabalhadores não desapareça (...), pois o capital conhece o trabalhador apenas como animal de trabalho, como uma besta reduzida às mais estreitas necessidades corporais’” (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 79).
“A fim de justificar o injustificável fato de o propósito de toda atividade humana ser a produção de mercadorias e não a existência humana, uma importante parte da ‘educação contínua’ do e sob o capital – ‘pela qual os indivíduos particulares são diariamente e por toda parte embebidos nos valores da sociedade de mercadorias’ – diz respeito à própria estrutura histórica desta sociedade de mercadorias, que é propalada ‘como algo lógico e natural’, e com isso, toda e qualquer ordem sociometabólica alternativa pode ser a priori descartada como ilógica e antinatural’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 80).
“Se se apreende a educação nesse sentido mais amplo, não se pode deixar de concordar com a constatação prática segundo a qual ‘as instituições formais de educação são uma parte importante do sistema global de internalização [do capital]. Mas apenas uma parte’. Pois, ‘embora o período de educação institucionalizado seja limitado sob o capitalismo a relativamente poucos anos da vida dos indivíduos, a dominação ideológica da sociedade prevalece por toda a sua vida’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 80).
“Quer os indivíduos participem ou não – por mais ou menos tempo, mas sempre em um número de tempo bastante limitado – as instituições formais de educação, eles devem ser induzidos a uma aceitação ativa (ou mais ou menos resignada) dos princípios reprodutivos orientadores dominantes da própria sociedade, adequados a suas posição na ordem social, e de acordo com as tarefas reprodutivas que lhes foram atribuídas” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 80).
“Por conta disso, ‘fica bastante claro que a educação formal não é a força ideologicamente primária que consolida o sistema do capital; tampouco ela é capaz de, por si só, fornecer uma alternativa emancipatória radical’ (...). Isso se torna ainda mais contundente se se tiver em vista o ato de que ‘o capitalismo avançado’ pôde seguramente ordenar seus negócios de modo a limitar o período de educação institucionalizada ou uns poucos anos economicamente convenientes da vida dos indivíduos e mesmo fazê-lo de maneira discriminadora/elitista’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 80).
“Seria realmente um absurdo esperar uma formulação de um ideal educacional, do ponto de vista da ordem feudal em vigor, que considerasse a hipótese da dominação dos servos, como classe, sobre os senhores da bem-estabelecida classe dominante. Naturalmente, o mesmo vale para a alternativa hegemônica fundamental entre o capital e o trabalho” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 81).
“As determinações gerais do capital afetam profundamente cada âmbito particular [da existência humana] com alguma influência na educação, e de forma nenhuma apenas as instituições educacionais formais. Estes estão estritamente integrados na totalidade dos processos sociais. Não podem funcionar adequadamente exceto se estiverem em sintonia com as determinações educacionais gerais da sociedade como um todo” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 81).
“No interior da ‘concepção de educação há muito dominante, os governantes e os governados, assim como os educacionalmente privilegiados (sejam esses indivíduos empregados como educadores ou administradores no controle das instituições educacionais) e aqueles que têm de ser educados, aparecem em compartimentos separados, quase estanques’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 82).
“É exatamente com base da formulação gramsciana, segundo a qual, ‘não existe nenhuma atividade humana da qual se possa excluir toda intervenção intelectual’ – ou seja – ‘não se pode separar o homo faber do homo sapiens’ – que, se torna possível uma adequada apreensão dessa ‘concepção de educação há muito dominante’, tanto em pelo fato de esta ‘define tanto a educação como atividade intelectual, da maneira mais tacanha possível’, quanto porque, ‘simultaneamente, ela exclui a esmagadora maioria da humanidade do âmbito das ação como sujeitos, e condena-os, para sempre, a serem apenas considerados como objetos (e manipulados no mesmos sentido) – que não deixa de expressar uma forma específica de separação entre ‘homo faber’ e ‘homo sapiens’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 82).
“Por conta dessas determinações sistêmicas, ‘a educação institucionalizada, especialmente nos últimos 150 anos, serviu – no seu todo – ao propósito dos sistema do capital’, é ainda mais duro ao afirmar que ‘uma das funções principais da educação formal nas nossas sociedades é produzir tanta conformidade ou consenso quanto for capaz, a partir de dentro e por meio dos seus próprios limites institucionalizados e legitimamente sancionados’. Ou seja, atualmente, ‘a principal função da educação formar é agir como um cão-de-guarda ex-office e autoritário para induzir um conformismo generalizado em determinados modos de internalização, de forma a subordiná-los às exigências da ordem estabelecida’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 82).
“Afirma: ‘nem mesmo os priores grilhões têm como predominar uniformemente’. ‘Não fosse por esse inconveniente [...], o domínio da educação institucional formal e estreita poderia reinar para sempre em favor do capital’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 82).
“Mas ‘o fato de a educação formal não poder ter êxito na criação de uma conformidade universal não altera o fato de, no seu todo, ela estar orientada para aquele fim’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 83).
“Obviamente, essas conclusões de Mészáros não devem levar ao disparate de se negar a educação formal, a escola, ou toda e qualquer forma de institucionalização da educação, mesmo que estas tenham servido, ‘especialmente nos últimos 150 anos’, à perpetuação das estruturas sociais do capital. Deve-se aqui, novamente, ter a capacidade de enxergar ‘o fundamento não-alienado daquilo que se reflete de uma forma alienada’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 84).
“Trata-se, de fato e portanto, da formulação de uma abordagem educacional que abarque a ‘totalidade das práticas político-educacional-culturais, na mais amplo concepção do que seja uma transformação emancipadora’ (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 85). O papel a ser ocupado pela escola em meio ao processo de transformação emancipadora não deve ser definido de antemão. A instituição escolar tem, em contrapartida, de afirmar sua vitalidade no interior desse processo”  (ANTUNES, 2012, p. 85).
“A questão de saber se ao pensamento humano cabe alguma verdade objetiva não é uma questão da teoria, mas uma questão prática. É na prática que o homem tem que provar a verdade, isto é, a realidade e o poder, a natureza citerior de seu pensamento. A disputa acerca da realidade ou não realidade do pensamento – que é isolado da prática – é uma questão puramente escolástica” (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 85).
“Ou seja, o potencial emancipador da escola tem de ser demonstrado praticamente, e não a partir de postulados abstratos prévia e arbitrariamente supostos. A polêmica discussão acerca dos limites e possibilidades da educação institucional em meio a um processo de transformação qualitativa, radical, pode ser iniciada por duas interrogações, formuladas por Mészáros: ‘o que aprendemos [ao longo da vida] de uma forma ou outra? Será que a aprendizagem conduz à auto-realização dos indivíduos como indivíduos socialmente ricos humanamente , ou está ela a serviço da perpetuação, consciente ou não, da ordem social alienante e definitivamente incontrolável do capital’? (...) ‘Será o conhecimento o elemento necessário para transformar em realidade o ideal da emancipação humana, em conjunto com uma firme determinação e dedicação dos indivíduos para alcançar, de maneira bem-sucedida, a auto-emancipação da humanidade, apesar de todas as adversidades, ou será, pelo contrário, a adoção pelos indivíduos, em particular de modos de comportamento que apenas favorecem a concretização dos objetivos reificados do capital’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 85-86).
“Para Mészáros, trata-se, portanto, ‘de reivindicar uma educação plena para toda a vida, para que seja possível colocar em perspectiva a sua parte formal, a fim de instituir, também aí, uma reforma radical’. Ou, para afirmar a mesma coisa de modo ainda mais enfático, é exatamente no espírito de uma concepção de educação plena para toda a vida, isto é, refeita ‘do começo até um fim sempre aberto’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 86).
“Que todas as dimensões da educação podem ser reunidas. Dessa forma, os princípios orientadores da educação formal devem ser desatados do seu tegumento da lógica do capital, de imposição de conformidade, e em vez disso mover-se em direção a um intercâmbio ativo e efetivo com práticas educacionais mais abrangente [...]. Sem um progressivo e consciente intercâmbio com processos de educação abrangentes como a ‘nossa própria vida’, a educação formal não pode realizar as suas muito necessárias aspirações emancipadoras. Se, entretanto, os elementos progressistas da educação formal forem bem-sucedidos em redefinir a sua tarefa num espírito orientado em direção à perspectiva de uma alternativa hegemônica à ordem existente, eles poderão dar uma contribuição vital para romper a lógica do capital, não só no seu próprio e mais limitado domínio como também na sociedade como um todo’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 86-87).
“Em Mészáros, então, não se trata de simplesmente abolir as instituições formais de ensino e esperar daí qualquer superação dos complexos e abrangentes problemas da autoalienação humana. Tampouco se resolve esse problema pela via reformista, ‘pois o que existia antes de tais reformas será certamente restabelecido, mais cedo ou mais tarde, devido ao absoluto fracasso em desafiar, por meio de uma mudança institucional isolada, a lógica autoritária global do próprio capital’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 87).
“Por conseguinte, ‘o que precisa ser confrontado e alterado fundamentalmente é todo o sistema de internalização, com todas as suas dimensões, visíveis e ocultas’, pois uma confrontação à educação estabelecida, tomada em seu sentido mais amplo, representa ‘o maior desafio ao capitalismo [e ao capital] em geral, pois afeta diretamente os processos mesmos de ‘interiorização’ por meio das quais a alienação e a reificação puderam, até agora, predominar sobre a consciência dos indivíduos’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 87).
“Nesse sentido, ‘romper com a lógica do capital na área da educação equivale [...] a substituir as formas onipresentes e profundamente enraizadas de internalização mistificadora por uma alternativa concreta abrangente’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 87). “Aquilo que Mészáros chama de uma ‘contra-internalização’, com base nos parâmetros reprodutivos da ordem hegemônica alternativa do trabalho” (ANTUNES, 2012, p. 87).
“Inicialmente, por utopias educacionais Mészáros compreende as preocupações – genuinamente humanitárias, aliás – presentes no interior da tradição iluminista liberal. Ou seja, aquelas que, na fase ascendente do capitalismo, de algum modo assumiram ‘uma postura crítica diante dos excessos da nova ordem emergente e do impacto negativo de algumas tendências já visíveis sobre o desenvolvimento pessoal dos indivíduos’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 88).
“Diferentemente da época do iluminismo, [...] que podia ainda produzir utopias educacionais nobres, [...] a fase decadente da história do capital, que culmina na apologia da destruição ilimitada levada a cabo pelo desenvolvimento monopolista e imperialista do século XX e sua extensão no século XXI, teve de trazer consigo uma crise educacional antes inconcebível” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 88).
“No interior dessas formulações educacionais utópicas, mesmo que de modo inconscientemente, ‘a relação entre o problema e a sua solução está, na verdade, revertida, e com isso ela [a solução] redefine anistoricamente o primeiro, de maneira a ajustar-se à solução – capitalistamente permissível – que fora conceitualmente preconcebida, isto é, o problema tem de ser redefinido ou alterado até se ajustar à solução: a perpetuação da autorreprodução do capital’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 90).
“Consequentemente, a insolúvel contradição de todas as formulações educacionais utópicas ‘reside na concepção [...] da mudança significativa como perpetuação do existente’ (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 91). Não se trata de equívoco teórico, mas sim prático. O problema, portanto, não é epistemológico, é ontológico” (ANTUNES, 2012, p. 91).
“Por reformismo Mészáros compreende o movimento no interior do qual as mudanças – ou reformas ‘são admissíveis apenas com o único e legítimo objetivo de corrigir algum detalhe defeituoso da ordem estabelecida, de forma que sejam mantidas intactas as determinações estruturais fundamentais da sociedade como um todo, em conformidade com as exigências inalteráveis da lógica global de um determinado sistema de reprodução’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 91).
“A estratégia reformista – que, tal como as utopias educacionais, se norteia pela noção de mudança significativa’ como ‘perpetuação do existente’ – está também fadada, mais que ao fracasso, à inutilidade, ‘porque o reformador visa a uma melhoria no interior da estrutura dada, e por intermédio dos meios da mesma estrutura, estando portanto sujeito às mesmas contradições que pretende contrapesar ou neutralizar’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 92).
“Limitar uma mudança educacional radical às margens corretivas interesseiras do capital significa abandonar de uma só vez, conscientemente ou não, o objetivo de uma transformação social qualitativa. Do mesmo modo, contudo, procurar margens de reforma sistêmica na própria estrutura do sistema do capital é uma contradição em termos” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 93).
“A conclusão do argumento de Mészáros é enfática: ‘é por isso que é necessário romper com a lógica do capital se quisermos contemplar a criação de uma alternativa educacional significativamente diferente. E isso em virtude que a razão para o fracasso de todos os esforços anteriores, e que se destinavam a instituir grandes mudanças na sociedade por meio de reformas educacionais lúcidas, reconciliados com o ponto de vista do capital, consistia – e ainda consiste – no fato de as determinações fundamentais do sistema do capital serem irreformáveis. Como sabemos muito bem pela lamentável história da estratégia reformista, [...] o capital é irreformável porque pela sua própria natureza, como totalidade reguladora sistêmica, é totalmente incorrigível’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 93).
“Uma ressalva poderia aqui ser formulada, entretanto, pois aquilo que se convencionou chamar de Estado de bem-estar social não deixa de ser uma evidência concreta de que houve um determinado momento histórico em que o reformismo foi capaz de trazer algumas conquistas, inclusive educacionais, á classe trabalhadora” (ANTUNES, 2012, p. 90).
“Deve-se, contudo, salientar que essas conquistas – reais, aliás – por um lado, não se universalizaram, isto é, não se estenderam de modo equivalente às classes trabalhadoras dos diversos países capitalistas (ainda mais se se comparar os assim chamados países avançados aos dependentes); e que, por outro, em sua totalidade, essas conquistas deram-se no interior dos estreitos limites do sistema de metabolismo social do capital” (ANTUNES, 2012, p. 95).
“Mas, então, como é possível afirmar que a ‘transcendência positiva da alienação é, em última análise, uma tarefa educacional’ (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 95). Ou que, ‘a efetiva transcendência da auto-alienação do trabalho’ seja caracterizada como uma tarefa inevitavelmente educacional’ (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 95), se ‘a tendência socioeconômica da alienação que tudo traga foi suficientemente poderosa para extinguir sem deixar rastro, até mesmo os ideais mais nobres da época do Iluminismo’, e para condenar ‘ o reformismo liberal e socialdemocrático, que já teve como poderoso aliado o expansionismo dinâmico do capital, [...] à futilidade da pregação piedosa’? Aliás, uma ‘pregação que as personificações do capital não podem absolutamente ouvir’. Para se responder adequadamente a essa questão, temos necessariamente de precisar o que Mészáros entende por educação. Inicialmente, ‘devemos distinguir entre concepção e apresentação’. Portanto, muito embora para sua apresentação – ou exposição – Mészáros se utilize da definição paracelsiana, a concepção de educação que estrutura sua formulação teórica tem forte inspiração lukacsiana: ‘o significado real de educação, digno de seu preceito, é fazer os indivíduos viverem positivamente à altura dos desafios das condições sociais historicamente em transformação – das quais são também os produtores mesmo sob as circunstâncias mais difíceis’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 95-96).
“Em termos teóricos, é exatamente o sentido dado pelo termo ‘positivamente’ que atribui a essa concepção de educação um caráter radicalmente distinto em relação às formulações anteriormente citadas – reformismo e utopias educacionais, que, aliás, comumente se manifestam em um mesmo movimento. Essa diferença, entretanto, para além da esfera lógica, possui sólido fundamento ontológico na ‘substância social’ do pensamento de Mészáros; isto é: na adoção prática do ponto de vista do trabalho como eixo fundamental, tanto ponto de partida quanto de chegada, de toda a sua obra” (ANTUNES, 2012, p. 97).
“(...) as forças educacionais exigidas podem ser ativadas com êxito para a realização dos objetivos e valores adotados do desenvolvimento socialista da sociedade visado por seus membros. Por conseguinte, o preceito ideal e o papel prático da educação no curso da transformação socialista consistem em uma intervenção efetiva continuada no processo social em andamento por meio da atividade dos indivíduos sociais, conscientes dos desafios que têm de confrontar como indivíduos sociais, de acordo com os valores exigidos e elaborados por eles para cumprir seus desafios” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 98).
“A doutrina materialista sobre a modificação das circunstâncias e da educação esquece que as circunstâncias são modificadas pelos homens e que o próprio educador tem de ser educado. Ela tem, por isso, de dividir a sociedade em duas partes – a primeira das quais está colocada acima da sociedade. A coincidência entre a altera[cão] das circunstâncias e a atividade ou automodificação humanas só pode ser apreendida e racionalmente compreendida como prática transformadora” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 100).
“O educador, que também necessita educar-se, é parte da sociedade alienada, exatamente como qualquer outra pessoa. Sua atividade, consistindo em uma conceituação mais ou menos adequada sobre um processo real, não é ‘atividade não-alienada’, em virtude do fato de estar ele, a seu modo, consciente da alienação. Na medida em que é parte da alienação, também ele tem necessidade de ser educado” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 100).
“Portanto, é absolutamente vital compreender que o estado de alienação a que a humanidade está sujeita deve ser superado necessariamente a partir de si próprio, uma vez que ‘os que estão fora da sociedade alienada’ ou ‘fora da alienação’ não estão em parte alguma” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 101).
“A nossa tarefa educacional é, simultaneamente, a tarefa de uma transformação social, ampla e emancipadora. Nenhuma das duas pode ser posta à frente da outra. Elas são inseparáveis. A transformação social emancipadora radical requerida é inconcebível sem uma concreta e ativa contribuição da educação no seu sentido amplo [...]. E vice-versa: a educação não pode funcionar suspensa no ar. Ela pode e deve ser articulada adequadamente e redefinida constantemente no seu inter-relacionamento dialético com as condições cambiantes e as necessidades da transformação social emancipadora e progressiva em curso. Ou ambas têm êxito e se sustentam, ou fracassam juntas” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 101).
“A primeira vista, essa pode aparecer uma afirmação relativamente simples e corriqueira. Suas implicações, entretanto, são profundas e de muito longo alcance. A primeira dela é que ‘não se pode falar em esperar o estabelecimento de relações humanas socialistas, até depois de atingidas certas metas econômicas predeterminadas: os objetivos educacionais e os programas econômicos devem ser realizados numa integração mútua’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 101-102).
“É por essa razão que ‘o destinatário da educação socialista não pode ser simplesmente o indivíduo apartado, como no modelo dos ideais educacionais tradicionais, ao contrário, a educação socialista se destina aos indivíduos isolados. Em outras palavras, concerne aos indivíduos cuja autodefinição como indivíduos - em contraste com o discurso genérico abstrato da filosofia tradicional sobre a individualidade isolada auto-referenciada [...] – não pode sequer ser imaginada sem a relação mais estreita com seu meio social real e com a situação histórica específica claramente identificável em que seus desafios humanos inescapavelmente emergem’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 103-104).
“Assim, a categoria indivíduo social configura uma definição ontologicamente mais precisa – isto é, aquela que consegue ‘apoderar-se da matéria, em seus pormenores, [...] analisar suas diferentes formas de desenvolvimento, e [...] perquirir a conexão íntima que há entre elas’ (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 106) - disso que se manifesta sob o ‘irreconciliável antagonismo entre o capital social total e a totalidade do trabalho’ (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 106); ou seja: ‘a totalidade da força de trabalho se envolve numa confrontação cada vez mais intensa com o capital monopolista – o que traz consigo profundas consequências para o desenvolvimento da consciência social [dos indivíduos]’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 106-107).
“Portanto, ‘a educação socialista só pode cumprir seu preceito se for articulada a uma intervenção consciente e efetiva no processo de transformação social’ (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 109). É por isso que Marx afirma em entrevista concedida ao Jornal Chicago Tribune, em dezembro de 1878, que a passagem dos meios de produção à propriedade coletiva, segundo ele ‘o resultado do movimento [socialista]’ – cujo objetivo final é ‘a emancipação dos trabalhadores’ – é ‘uma questão de tempo, de educação e do desenvolvimento de formas sociais superiores’” (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 109).
“Somente por meio do mais ativo e constante envolvimento da educação no processo de transformação social – alcançado por sua capacidade de ativar a reciprocidade dialética progressivamente mais consciente entre os indivíduos e a sociedade – é possível transformar em força operativa efetiva, historicamente progressiva e concreta o que no início podem ser apenas princípios e valores orientadores genéricos” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 109).
“(...) o projeto socialista não pode obter êxito se for articulado e afirmado de maneira consistente como a alternativa hegemônica ao metabolismo social estruturalmente resguardado e alienante do capital: a alternativa hegemônica do trabalho; e, por outro, por que ‘na concepção marxista a efetiva transcendência da auto-alienação do trabalho seja caracterizada como uma tarefa inevitavelmente educacional’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 110-111).
“Ademais, é tão somente no interior dessa profunda reciprocidade que ‘a educação praticamente efetiva dos indivíduos sociais se torna sinônima do significado mais profundo de educação como auto-educação’ – ‘as referências de Marx ao indivíduo social rico têm o intuito de indicar esse tipo de autodefinição como a estrutura viável da educação’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 111).
“Somente por meio da educação concebida como a auto-educação radical dos indivíduos sociais, no curso de sua ‘alteração que só pode ter lugar em um movimento prático, em uma revolução’, somente nesse processo podem os indivíduos sociais tornar-se simultaneamente educadores e educados. Essa é a única maneira concebível de superar a dicotomia conservadora de todas as concepções elitistas que dividem a sociedade em seletos ‘educadores’ misteriosamente superiores e o resto da sociedade consignada à sua posição permanentemente subordinada de ‘educados’, como realçado por Marx. A esse respeito, devemos constantemente nos lembrar de que a definida ‘alteração do povo para se tornar adequado para fundar uma nova sociedade’ só é plausível pelo desenvolvimento da ‘consciência comunista de massa’, que abarca a maioria esmagadora da sociedade” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 111).
“Em síntese, a noção de educação como autoeducação é aquela no interior da qual os indivíduos sociais são, ao mesmo tempo, educadores e educados, isto é, determinantes-determinados de um processo transformador permeado pela mais absoluta reciprocidade entre educação e transformação. No que concerne a esse amplo processo de transformação qualitativa, tanto do ponto de vista da ‘mudança qualitativa das condições objetivas de reprodução social’ quanto da ‘transformação progressiva da consciência’, ‘dois conceitos principais devem ser postos em primeiro plano: a universalização da educação e a universalização do trabalho como atividade humana autorrealizadora’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 101).
“É evidente que quando a atividade vital do homem é apenas um meio para um fim [isto é,  sob o trabalho alienado], não se pode falar de liberdade [nem de educação], porque as potências humanas que se manifestam nesse tipo de atividade são dominadas por uma necessidade exterior a elas” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 112).
“São essas as razões de Mészáros afirmar que ‘apenas dentro da perspectiva de ir para além do capital, o desafio de universalizar o trabalho e a educação, em sua indissolubilidade, surgirá na agenda histórica” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 113).
“Nesse sentido, o papel da educação é absolutamente vital, tanto no que diz respeito à ‘elaboração de estratégias apropriadas e adequadas para mudar as condições objetivas da reprodução, como para a automudança consciente dos indivíduos chamados a concretizar a criação de uma ordem social metabólica radicalmente diferente’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 114).
“Mas cabe aqui ressaltar que a educação socialista ‘não pode cumprir seu preceito histórico sem dar o devido peso aos objetivos transformadores abrangentes essencialmente importantes vinculados a seu horizonte temporal apropriado’ – isto é, é ‘desnecessário dizer que uma transformação dessas proporções não pode acontecer da noite para o dia’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 116).
“Obviamente, ‘isso não significa que os objetivos mais fundamentais da mudança estrutural devam ou possam ser deixados para um futuro distante, por conta da perspectiva inevitavelmente de longo prazo de sua plena realização’. Muito ao contrário disso – e profundamente articulado ao processo de ‘universalização conjunta do trabalho e da educação’, que por sua vez se pauta na reciprocidade que se estabelece (e deve necessariamente se estabelecer) entre educação e transformação” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 116).
“Ganha, então, concretude a afirmação de Mészáros segundo a qual ‘o papel da educação não poderia ser maior na tarefa de assegurar uma transformação socialista plenamente sustentável’ – afirmação na qual, cabe ressaltar, os conceitos educação e transformação atuam,  um sobre o outro,  como ‘determinantes [que] são, também eles, determinados’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 117).
“Se ‘é certo que a arma da crítica não pode substituir a crítica das armas, [e] que o poder material tem de ser derrubado pelo poder material’ (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 98), o ‘papel da educação, propriamente definido como o desenvolvimento contínuo da consciência socialista, é sem dúvida um componente crucial desse grande processo transformador’ (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 117), pois, como a história da mostrou, ‘a teoria converte-se em força material quando penetra nas massas’” (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 117).

À guisa da conclusão

“Este livro constitui  um importante marco de um processo investigativo que teve como ponto de partida a necessidade de uma compreensão mais aprofundada acerca da concepção de educação presente na obra de Mészáros – bem como, de modo mais específico, ainda no interior do pensamento desse filósofo, a necessidade de uma compreensão do papel da educação na manutenção da sociedade atual e sua função na possível superação da organização societal estabelecida. Mas compreender a concepção de educação em Mészáros exige o adequado encaminhamento de uma fundamentação da e na categoria trabalho” (ANTUNES, 2012, p. 119).
“Assim, no primeiro capítulo, a partir das formulações de Marx, Lukács e Mészáros, foram apontados os mecanismos por meio dos quais uma parte específica da natureza torna-se, por meio do trabalho, um novo tipo de ser: o ser humano. Ou seja, o ser tornado humano empreende uma transformação da e na natureza, com a finalidade de adaptá-la às suas necessidades humanas” (ANTUNES, 2012, p. 119).
“É nesse sentido que, tanto no que se refere aos primeiros passos, de ordem mais política, quanto ao movimento transformador como um todo, de ordem mais econômica, o papel a ser desempenhado pela educação é absolutamente vital, pois somente a educação é capaz de nortear todo o processo, desde os primeiros passos, passando pela tomada do poder, até a constituição histórica de uma ordem sociometabólica hegemônica distinta” (ANTUNES, 2012, p. 121).
“No interior desse movimento de delimitação conceitual, nos detivemos na radical crítica formulada por Mészáros àquilo que chamou de utopias educacionais e de estratégia reformista, tanto do ponto de vista teórico quanto prático (...). Depois dessa profunda crítica, passamos aos encaminhamentos positivos propriamente ditos da concepção de educação de Mészáros, todos centrados na adoção prática do ponto de vista do trabalho como eixo fundamental de análise e propositura e articulados entre si pela noção de ‘igualdade substantiva’, o ‘conceito-chave’ da estratégia e da educação socialistas (...). Mészáros não é um pedagogo. Nem mesmo um filósofo da educação. Foi, e é, entretanto, um professor, um educador, no melhor sentido do termo – em suas próprias palavras, ‘o bom educador é alguém que inspira a autoeducação’” (MÉSZÁROS apud ANTUNES, 2012, p. 122).
“Depois tem-se, então, que trabalho e educação se determinam reciprocamente, ou seja, se o trabalho ‘é o determinante último, é também um determinante determinado’. Não é, portanto, de modo algum surpreendente que a questão central da formulação educacional de Mészáros seja a ‘interiorização’, tanto do ponto de vista objetivo, isto é, circunscrita pelas condições materiais objetivas e historicamente determinadas, quanto do ponto de vista subjetivo, ou seja, pela adoção pelos sujeitos de determinados parâmetros sociais objetivos como horizontes de existência individual e coletiva (...). Para Mészáros, exatamente em virtude dessas apreensões, um projeto educacional emancipatório, se intenta algum êxito concreto, alguma materialidade transformadora, tem necessariamente de estar articulado a um projeto societal revolucionário, e ainda, além disso, necessita do próprio processo de transformação em curso, tanto porque é a própria situação social cambiante que necessariamente ajusta, adéqua, redefine, conforma o próprio projeto educacional, quanto porque é tão somente por meio da educação que se torna possível transformar em ‘força operativa efetiva’ aqueles inicialmente ‘apenas princípios e valores orientadores genéricos’” (ANTUNES, 2012, p. 123).

“Se há em Mészáros algum pessimismo, esse se configura como o mais firme ‘pessimismo da razão’, pois, conforme Marx afirma enfaticamente, ‘ser radical é agarrar as coisas pela raiz’. Mas, como ‘para o homem, a raiz é o próprio homem’, o q    eu de fato transborda da obra – e da vida – de Mészáros é o mais belo, solidário e ontológico ‘otimismo da vontade’” (MARX apud ANTUNES, 2012, p. 124).
JaloNunes.

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