Reproduzido do original em:
https://pt.scribd.com/doc/291983456/Pedido-de-Impeachment-Helio-Bicudo-Reale-Junior#download acesso em 03 de dez. de 2015.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR
PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS FEDERAIS, DEPUTADO EDUARDO CUNHA
“O
princípio geral a se observar é que ‘(...) não se deve proceder
contra a perversidade do tirano por iniciativa privada, mas sim pela
autoridade pública’, dito isto, reitera-se a tese de que, cabendo
à multidão prover-se de um rei, cabe-lhe também depô-lo, caso se
torne tirano...” (Santo Tomás de Aquino. Escritos
Políticos.
Petrópolis: Vozes, 2001. p. 25).
“Em
todo país civilizado, há duas necessidades fundamentais: que o
poder legislativo represente o povo, isto é que a eleição não
seja falsificada, e que o povo influa efetivamente sobre os seus
representantes.” (Rui Barbosa. Migalhas de Rui Barbosa,
org. Miguel Matos).
(...)
(...)
1- Dos fatos:
O Brasil está mergulhado em
profunda crise. Muito embora o Governo Federal insista que se trata
de crise exclusivamente econômica, na verdade, a crise é política
e, sobretudo, MORAL.
O Governo Federal também tenta
fazer crer que tal crise pode se tornar institucional; sugere que se
arrefeçam os ânimos, admitindo-se o quadro de horror que se
estabeleceu no país; porém, não há que se falar em crise
institucional. As instituições estão funcionando bem e, por
conseguinte, possibilitam sejam desvendados todos os crimes
perpetrados no coração do Poder.
O Tribunal Superior Eleitoral, em
longo e minucioso processo, tem apurado inúmeras fraudes,
verdadeiros estelionatos, encetados para garantir a reeleição da
Presidente da República, tendo o Ministro Gilmar Mendes aduzido que,
se soubesse, anteriormente, do que sabe na atualidade, não estariam
aprovadas as contas de campanha da Presidente. Também o Ministro
João Otávio de Noronha defendeu a abertura de investigação
referente à campanha da denunciada.
Foi assim que, no último dia 26
de agosto, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu reabrir o julgamento
sobre as contas de campanha da Presidente da República.
Em paralelo, o Tribunal de Contas
da União (TCU) assinalou flagrantes violações à Lei de
Responsabilidade Fiscal, as quais ensejaram Representação Criminal
à Procuradoria Geral da República, em petição elaborada pelo ora
denunciante Miguel Reale Júnior.
Essa notitia criminis
demonstra que a Presidente, que sempre se apresentou como valorosa
economista, pessoalmente responsável pelas finanças públicas,
deixou de contabilizar empréstimos tomados de Instituições
Financeiras públicas (Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil),
contrariando, a um só tempo, a proibição de fazer referidos
empréstimos e o dever de transparência quanto à situação
financeira do país. Em suma, houve uma maquiagem deliberadamente
orientada a passar para a nação (e também aos investidores
internacionais) a sensação de que o Brasil estaria economicamente
saudável e, portanto, teria condições de manter os programas em
favor das classes mais vulneráveis. Diante da legislação penal
comum, a Presidente incorrera, em tese, nos crimes capitulados nos
artigos 299, 359-A e 359-C, do Código Penal, respectivamente,
falsidade ideológica e crimes contra as finanças públicas.
Em 26 de agosto do corrente ano,
Ministro do TCU noticiou à BBC que alertara a Presidente acerca das
irregularidades em torno das chamadas pedaladas fiscais. E, no último
dia 07, o mesmo Tribunal, em decisão histórica, inegavelmente
técnica, rejeitou as contas do Governo Dilma, relativamente a 2014.
Na esteira do histórico processo
do Mensalão, Ação Penal Originária 470, em que restaram expostos
os planos de perpetuação no poder por parte do Partido Político ao
qual a Presidente da República é filiada, foi deflagrada a Operação
Lava Jato, que em cada uma de suas várias fases colhe pessoas
próximas à Presidente, desconstruindo a aura de profissional
competente e ilibada, criada por marqueteiros muito bem pagos.
Com efeito, a máscara da
competência fora primeiramente arranhada no episódio envolvendo a
compra da Refinaria em Pasadena pela Petrobrás. Por todos os ângulos
pelos quais se analise, impossível deixar de reconhecer que o
negócio, mesmo à época, se revelava extremamente prejudicial ao
Brasil. Segundo consta, as perdas foram superiores a setecentos
milhões de reais.
Na oportunidade, a Presidente da
República era presidente do Conselho da Estatal e deu como desculpa
um equívoco relativo a uma cláusula contratual. À época, muitos
indagaram se essa suposta falha não infirmaria a fama de competência
e expertise na seara de energia, porém, ninguém teve a audácia de
desconfiar da probidade da Presidente.
Mas, como se diz popularmente,
Pasadena foi apenas a ponta do “iceberg”, pois a Operação Lava
Jato realizou verdadeira devassa em todos os negócios feitos pela
Petrobrás, constatando, a partir de colaborações premiadas
intentadas por Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef, que as obras e
realizações propaladas como grandes conquistas do Governo Dilma não
passavam de meio para sangrar a promissora estatal que, atualmente,
encontra-se completamente descapitalizada e desacreditada, inclusive
internacionalmente. Nas palavras de um dos Ministros do Supremo
Tribunal Federal, comparado à Lava Jato, o Mensalão se transformou
em feito passível de ser julgado por Juizado de Pequenas Causas.
Vale destacar que Paulo Roberto
Costa era pessoa muito próxima à Presidente da República, ao lado
de quem posou para várias fotografias em eventos públicos, tendo
sido convidado para o casamento da filha da Presidente, em cerimônia
bastante reservada .
Para a infelicidade do país, os
prejuízos havidos com Pasadena ficaram pequenos diante do quadro de
descalabro que se descortinou. Reforça-se, a cada dia, a convicção
de que algumas empresas foram escolhidas para serem promovidas
internacionalmente e, a partir de então, participando de irreais
licitações, drenar a estatal, devolvendo grande parte dos valores
por meio de propinas, ou de doações aparentemente lícitas.
Em outubro de 2014, ao prestar
seu segundo depoimento em colaboração, Alberto Youssef asseverou
que, dentre outras autoridades, a Presidente da República tinha
ciência do que acontecia na Petrobrás. Em 25 de agosto do ano
corrente, Youssef reafirmou que Lula e Dilma sabiam do esquema de
propinas, na Petrobrás. Em acórdão da lavra do Ministro Dias
Toffoli, exarado no Habeas Corpus de número 127.483/PR, o Egrégio
Supremo Tribunal Federal confirmou a validade da colaboração
premiada realizada com Youssef.
Por força das constatações da
Operação Lava Jato, foram presos o ex- Ministro José Dirceu, o
ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, o ex-dirigente da Petrobrás
Nestor Cerveró, pessoas que a Presidente fazia questão de
reverenciar, até que negar os descalabros ficasse impossível.
Apesar das investigações em
andamento e diante de fortes indícios de que muitas irregularidades
haviam sido praticadas, a denunciada seguiu discursando pelo Brasil,
reforçando a confiança nos dirigentes da estatal, como a presidente
Graça Foster. Aliás, durante todo o processo eleitoral, a
denunciada negou que a situação da Petrobrás, seja sob o ponto de
vista moral, seja sob o ponto de vista econômico, era muito grave.
Com efeito, mesmo com todas as
notícias veiculadas, a denunciada insistiu na estapafúrdia tese de
que as denúncias seriam uma espécie de golpe, mera tentativa de
fragilizar a Petrobrás, sempre destacando sua expertise na área de
economia e de energia, ou seja, a Presidente dava sua palavra acerca
da higidez da empresa! Vale lembrar que a presidente da Petrobrás
deixou o cargo apenas em fevereiro de 2015, quando a situação já
era insustentável, no segundo mandato, portanto.
Mas o quadro é ainda pior. A
Operação Lava Jato jogou luz sobre a promíscua relação havida
entre o ex- Presidente Lula e a maior empreiteira envolvida no
escândalo, cujo presidente já está preso, há um bom tempo. Não
há mais como negar que o ex- Presidente se transformou em verdadeiro
operador da empreiteira, intermediando seus negócios junto a órgãos
públicos, em troca de pagamentos milionários por supostas
palestras, dentre outras vantagens econômicas.
Em julho de 2015, o Ministério
Público Federal do Distrito Federal, por força do trabalho do
Núcleo de Combate à Corrupção, iniciou investigação pela
suposta prática de tráfico de influência, por parte do
ex-presidente Lula, a fim de apurar favorecimento ao grupo Odebrecht,
no exterior .
Recentemente, o Egrégio Tribunal
Regional Federal da 4ª. Região, por meio de acórdão prolatado
pelo Desembargador Federal João Pedro Gebran Neto, nos autos do
Habeas Corpus de número 503125866.2015.4.04.0000/PR, impetrado em
benefício do presidente da Odebrecht, denegou a ordem, aduzindo que
os fatos envolvendo a Petrobrás são notórios.
“O
histórico do processo é extenso, não sendo possível tal conclusão
da análise crítica e exclusiva do decreto prisional ora impugnado.
Há critérios para a decretação das prisões, os quais se fundam
no art. 312 do Código de Processo Penal, reservadas, como já
ressaltado pela 8ª Turma deste Tribunal, aos principais atores da
empreitada criminosa. Assim, 'em um grupo criminoso complexo e de
grandes dimensões, a prisão cautelar deve ser reservada aos
investigados que, pelos indícios colhidos, possuem o domínio do
fato como os representantes das empresas envolvidas no esquema de
cartelização ou que exercem papel importante na engrenagem
criminosa'. (HC nº 501676317.2015.404.0000). Ademais, a realidade
processual contradiz qualquer assertiva em sentido contrário. Há
delatores presos e não delatores em liberdade. Bom exemplo é o caso
do investigado e réu Ricardo Ribeiro Pessoa, Diretor da UTC, que,
mesmo após a obtenção da liberdade provisória, decidiu, por
iniciativa própria, celebrar acordo de delação premiada. Gerson de
Mello Almada, dirigente da Engevix, mesmo sem recorrer ao acordo de
colaboração, admitiu a existência de cartel, do pagamento de
propinas e indicou a participação da Odebrecht no esquema. 3.4.
Assim, presentes os pressupostos para decretação da prisão
preventiva, seja por força do risco à instrução processual, dada
a existência de indicativos que o paciente pretendeu destruir
provas, seja à ordem pública, ante a reiterada e multiplicidade de
condutas ilícitas praticadas por meio de pessoas jurídicas, as
quais até hoje mantém contratos com a administração pública,
atuando de modo organizado e cooperado para fraudar licitações,
aferir ganhos extraordinários, bem como risco à ordem econômica.
Sobre este último aspecto, desnecessário gastar tinta, porquanto
basta abrir qualquer jornal para verificar os prejuízos causados à
Petrobrás, à economia nacional e as severas consequências
internacionais que a empresa e o Estado estão na iminência de
sofrer”.
Os contornos de crime de
responsabilidade ficam mais salientes, quando se verifica que Lula é
muito mais do que um ex-Presidente, mas alguém que, segundo a
própria denunciada, lhe é indissociável e NUNCA SAIU DO PODER.
De fato, antes de o candidato do
PT para a eleição de 2014 estar definido, quando perguntada acerca
da possibilidade de o ex-Presidente voltar, a atual Presidente
respondeu que ele (Lula) não iria voltar porque nunca havia saído,
frisando que ambos seriam indissociáveis.
Ora, se a Presidente era (e é)
indissociável de Lula, muito provavelmente, sabia que ele estava
viajando o mundo por conta da Construtora Odebrecht, que
coincidentemente sagrou-se vencedora para realizar muitas obras
públicas, no Brasil e no exterior! Aliás, não se podem
desconsiderar as fortes acusações feitas pelos empresários
gaúchos, Auro e Caio Gorentzvaig, no sentido de que Dilma teria sido
imposta a Lula por referido grupo empresarial.
Recentemente, houve o vazamento
de um relatório do COAF, dando conta de que o ex- Presidente Lula
teria recebido quase TRINTA MILHÕES DE REAIS, boa parte de empresas
que contratam com o Governo Federal, por supostas palestras. Pois
bem, ao invés de mandar investigar os estranhos recebimentos, a
Presidente da República, por meio de seu Ministro mais próximo,
mandou apurar o vazamento da informação, em mais um sinal de que
está disposta a tudo para proteger seu antecessor.
A esse respeito, cumpre ressaltar
a constante defesa que a denunciada faz da figura do ex-presidente
Lula. Mesmo presentemente, objetivando lhe conferir certa imunidade,
estuda elevá-lo à condição de Ministro. Elevar à condição de
Ministro quem pode ter funcionado como operador da empreiteira que
desfalcou a Petrobrás?! A Imprensa nacional, inclusive, noticia que
a Presidente Dilma já passou o governo ao Ex-Presidente Lula, em uma
espécie de terceiro mandato! Um acinte!
Independentemente de qualquer
antecipação de juízo sobre culpa, estando o presidente da
Odebrecht preso, sendo fato notório que o Presidente Lula lhe
prestava assessoria nos contratos firmados e mantidos com o Poder
Público, não seria caso, no mínimo, de a Presidente Dilma Rousseff
afastar-se, ao menos institucionalmente, de seu antecessor?
Necessário apontar que, apesar
da edição da Lei de Acesso à Informação, os montantes enviados
para Cuba e Angola receberam a chancela de sigilosos. Estranhamente,
as empresas tão bem representadas pelo ex- Presidente, indissociável
da atual Presidente, segundo consta, conduziram obras nesses países!
Durante muitos anos, todos os
brasileiros foram iludidos com o discurso de que o ex- Presidente
Lula seria um verdadeiro promotor do Brasil, no exterior, um
propagandista que estaria prospectando negócios para as empresas
nacionais, no estrangeiro. No entanto, conforme foram se
descortinando os achados da Operação Lava Jato, restou nítido que
todo esse cenário serviu, única e exclusivamente, para sangrar os
cofres públicos.
Existe a tese de que nada haveria
contra a Presidente da República. No entanto, os escândalos que se
sucedem, de há muito, passam próximos a ela, não sendo possível
falar em mera coincidência, ou falta de sorte. A Presidente da
República faz parte desse plano de poder. E os Poderes constituídos
precisam, nos termos da Constituição Federal, agir.
Não é exagero lembrar que,
quando ainda era Ministra da Casa Civil, a Presidente tinha como seu
braço forte a ex-ministra Erenice Guerra, que sempre se encontra em
situações questionáveis, sendo certo que, mais recentemente,
envolveu-se na Operação Zelotes, referente à corrupção no Carf.
Como de costume, seja com relação
a Erenice Guerra, seja com relação a Graça Foster, seja com
relação a Nestor Cerveró, ou Jorge Zelada, a Presidente agiu como
se nada soubesse, como se nada tivesse ocorrido, mantendo seus
assistentes intocáveis e operantes na máquina de poder instituída,
à revelia da lei e da Constituição Federal.
Para espanto de todos, Edinho
Silva, tesoureiro da campanha da Presidente, apontado como receptor
de quase quatorze milhões de reais, é mantido no Governo, no
importante cargo de Ministro de Comunicação Social.
Poder-se-ia aduzir que fatos
anteriores ao exercício da Presidência da República seriam
irrelevantes, como, por exemplo, a compra da Refinaria em Pasadena,
enquanto Dilma Rousseff era Presidente do Conselho da Petrobrás.
Todavia, fazer referência a esses acontecimentos se revela preciso,
não com o fim de obter responsabilização por eles, mas com o
intuito de evidenciar que a tese do suposto desconhecimento se mostra
insustentável. Fosse um único fato, até se poderia admitir
tratar-se de um descuido, ou coincidência; porém, estando-se diante
de uma verdadeira continuidade delitiva, impossível crer que a
Presidente da República não soubesse o que estava passando a sua
volta. E os crimes se estenderam a 2015, ou seja, invadiram o
segundo mandato!
Em outras palavras, antes do
descortinar dos fatos apurados na Lava Jato, até era crível que a
compra de Pasadena se tivesse dado por um erro relativo a uma
cláusula contratual; entretanto, passado todo esse tempo, com todos
os escândalos que vieram à tona, tem-se que Pasadena foi apenas
mais um episódio e a estratégia de “não sei, não vi” se
revela modus operandi.
Renomados juristas proferiram
pareceres favoráveis à instalação do Processo de Impeachment e à
perda do cargo da Presidente da República, sugerindo, no entanto,
que seus crimes de responsabilidade seriam de natureza culposa. Ao
ver desses dignos estudiosos, a governante máxima teria sido apenas
negligente ao não responsabilizar seus subalternos.
Com todo respeito a esses nobres
pareceristas, com os quais ora se concorda acerca do cabimento e
procedência do Impeachment, nesta oportunidade, afirma-se que tudo
indica ter a denunciada agido com dolo, pois a reiteração dos
fatos, sua magnitude e o comportamento adotado, mesmo depois de
avisada por várias fontes, não são compatíveis com mera
negligência.
Reforça o entendimento de que a
Presidente da República agiu com dolo o fato de ela sempre se
mostrar muito consciente de todas as questões afetas ao setor de
energia, bem como aquelas relacionadas à área econômica e
financeira. Ademais, além de ser economista por formação, a
dirigente máxima do país ocupou cargos umbilicalmente relacionados
ao setor de energia, não sendo possível negar sua personalidade
centralizadora. Em análise bastante minuciosa, o jornalista,
escritor e político Fernando Gabeira, mostra bem que só pode alegar
falta de elementos para o Impeachment quem não concatena os fatos.
O caso é grave e, por isso,
lança-se mão de medida drástica, extrema, porém, CONSTITUCIONAL.
Apresentar esta denúncia constitui verdadeiro dever de quem estudou
minimamente o Direito, sobretudo em seus ramos Constitucional,
Administrativo e Penal. Golpe será permitir que o estado de coisas
vigente se perpetue. Como bem ensinara o saudoso Ministro Paulo
Brossard:
“O
sujeito passivo do impeachment é a pessoa investida de autoridade,
como e enquanto tal. Só aquele que pode malfazer ao Estado, como
agente seu, está em condições subjetivas de sofrer a acusação
parlamentar, cujo escopo é afastar do governo a autoridade que o
exerceu mal, de forma negligente, caprichosa, abusiva, ilegal ou
facciosa, de modo incompatível com a honra, a dignidade e o decoro
do cargo” (O Impeachment. 3ª. ed. São Paulo: Saraiva, 1992. p.
134).
Se esta Casa não tomar as
providências cabíveis, a tendência é realmente este terrível
quadro se acirrar, pois o Governo Federal já está movendo seus
tentáculos com o fim de mitigar a Lei Anticorrupção, objetivando,
novamente, favorecer as empresas que se encontram no centro dos
escândalos que assolam o país, como bem diagnosticado pelo Eminente
Jurista Modesto Carvalhosa, em recentes artigos. Aliás, o mesmo
Professor denunciou a condescendência criminosa da Presidente da
República, já em dezembro de 2014 .
Cumpre, ainda, chamar atenção
para o grave fato de o governo Federal ter tentado constranger o TCU,
por meio de estranha entrevista coletiva de três Ministros de
Estado, em plena tarde de domingo!
Parte dos fatos objeto do
presente feito pode constituir, além de crimes de responsabilidade,
crimes comuns. A Procuradoria Geral da República já está de posse
de representação pelos crimes comuns contrários à fé pública e
às finanças públicas. Por razões desconhecidas dos ora
subscritores, a representação ainda não foi avaliada pelo
Procurador Geral da República, Dr. Rodrigo Janot, recém-reconduzido
ao cargo.
Todavia, a possível ocorrência
de crime comum não inviabiliza o processo por crime de
responsabilidade. Muito ao contrário, a existência de crimes comuns
apenas reforça a necessidade de se punir a irresponsabilidade. Em
primeiro lugar, tem-se que a Constituição Federal, a lei e a
doutrina não afastam a possibilidade de dupla punição (por
infração política e também penal) e, em segundo lugar, diante da
inércia da autoridade competente para fazer apurar o crime comum,
ainda mais legítimo rogar a esta Egrégia Casa que assuma seu papel
constitucional. É o que ora se requer!
Centenas de juristas reunidos em
tradicional comemoração do dia “XI de Agôsto” externaram sua
indignação ao apoiar manifesto da lavra do Eminente Jurisconsulto
Flávio Flores da Cunha Bierrenbach.
Em 2015, em diversas
oportunidades, a população foi maciçamente às ruas, em números
muito superiores ao contingente de pessoas que se mobilizou em 1992.
Pouco antes da manifestação do dia 16 de agosto, ao lado de outros
tantos brasileiros, os três denunciantes gravaram vídeo para o
Movimento Vem pra Rua, convidando a população a se mobilizar.
O vídeo feito com o primeiro
signatário, bem como carta de sua autoria, lida por Rogério
Chequer, um dos líderes de tal Movimento, evidencia que, de há
muito, estamos vivendo em uma falsa Democracia, sendo certo que o
resgate da verdadeira se faz necessário.
O processo de Impeachment visa à
verdade real, os fatos ora narrados não limitam a atuação desta
Câmara e do Senado Federal, por conseguinte, desde logo, pleiteia-se
que sejam levadas em consideração as revelações que ainda estão
por vir. De todo modo, o que já há apurado resta suficiente para
deflagrar este processo, haja vista que a conduta omissa da
denunciada, relativa aos desmandos na Petrobrás, restou mais do que
comprovada, implicando a prática de crime de responsabilidade nos
termos do art. 9, itens 3 e 7, que encerra as seguintes tipificações
criminais:
“Art.
9º São crimes de responsabilidade contra a probidade na
administração:
3
- não tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados,
quando manifesta em delitos funcionais ou na prática de atos
contrários à Constituição;
7
- proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decôro
do cargo.”
No entanto, os crimes de
responsabilidade da denunciada não se limitam àqueles atentatórios
à probidade na administração, pois, como a seguir restará
evidenciado, sérias lesões ao orçamento foram perpetradas, seja
pela edição de decretos não numerados abrindo crédito
suplementar, sem autorização do Congresso Nacional; seja pela
prática das chamadas pedaladas fiscais, com inequívoca maquiagem
das contas públicas.
Este
cenário é que fez nascer e se consolidar nos brasileiros o desejo
de ver sua presidente impedida de continuar administrando o país.
Nada menos que 63% (sessenta e três por cento) da população
brasileira quer o Impeachment
de Dilma Rousseff,
revela pesquisa CNT/MDA1.
A realidade salta aos olhos! Ao
contrário do que prega a denunciada e aqueles que lhe são próximos,
notadamente o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o único
golpe que se praticou foi a reeleição da Presidente; sem contar a
sanha de seu Partido de se manter no poder.
Os crimes de responsabilidade de
Dilma Vana Rousseff exigem uma resposta firme do Congresso Nacional,
em uma única direção, a do impedimento.
Registre-se, por oportuno, que,
embora os denunciantes já tenham ofertado anterior pedido de
Impeachment contra a denunciada, inclusive aditando-o, é certo que
os fatos que se sucederam, após aquela oportunidade, exigem nova
denúncia para que se possa consolidar, com ainda maior clareza, os
crimes praticados por Dilma Rousseff, com destaque para a rejeição
das contas do Governo pelo Tribunal de Contas da União, bem como a
constatação de que as pedaladas invadiram o segundo mandato,
caracterizando inafastável continuidade delitiva.
2. - Dos crimes de
responsabilidade:
2.1. - Dos Decretos
Ilegais. Crime do art. 10, itens 4 e 6 da Lei 1.079, de 10 de abril
de 1950
A denunciada fez editar, nos anos
de 2014 e 2015, uma série de decretos sem número que resultaram na
abertura de créditos suplementares, de valores muito elevados, sem
autorização do Congresso Nacional.
Como se pode observar da tabela
anexa, os valores de créditos suplementares objeto de decretos não
numerados da denunciada foram da ordem de R$ 18.448.483.379,00
(dezoito bilhões, quatrocentos e quarenta e oito milhões,
quatrocentos e oitenta e três mil, trezentos e setenta e nove
reais).
Esses decretos foram publicados
após a constatação, pelo Tesouro Nacional, de que as metas
estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei
Orçamentária Anual não haviam sido cumpridas, como revelado pelo
Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do 5º
Bimestre de 2014 do Tesouro Nacional.
No Relatório consta,
expressamente, que:
“11.
Assim como o ocorrido com a grande parte dos países, o cenário
internacional teve significativa influência sobre a economia
brasileira. A redução do ritmo de crescimento da economia
brasileira afetou as receitas orçamentárias de forma que se faz
necessário garantir espaço fiscal para preservar investimentos
prioritários e garantir a manutenção da competitividade da
economia nacional por meio de desonerações de tributos. O nível
das despesas também foi influenciado por eventos não‐recorrentes,
como o baixo nível de chuvas e secas verificadas em diversas regiões
do país.
12.
Nesse contexto, o Poder Executivo enviou ao Congresso Nacional, por
intermédio da Mensagem nº 365, de 10 de Novembro de 2014, Projeto
de Lei que altera a LDO‐2014 (PLN nº 36/2014) no sentido de
ampliar a possibilidade de redução da meta de resultado primário
no montante dos gastos relativos às desonerações de tributos e ao
PAC. Ou seja, em caso de aprovação do referido projeto, o valor que
for apurado, ao final do exercício, relativo a desonerações e a
despesas com o PAC, poderá ser utilizado para abatimento da meta
fiscal. O presente relatório já considera o projeto de lei em
questão, indicando aumento de R$ 70,7 bilhões na projeção do
abatimento da meta fiscal. Isso posto, o abatimento previsto, neste
Relatório, é de R$ 106,0 bilhões, o que é compatível com a
obtenção de um resultado primário de R$ 10,1 bilhões. (GRIFAMOS).
A partir destas informações,
resta claro que o resultado das metas estabelecidas pela LDO
(resultado primário) não estava sendo cumprido pelo Governo
Federal, tanto que o resultado das metas de superávit primário foi
alterado por meio do mencionado PLN 36/2014 (transformado na Lei nº
13.053/2014) - projeto esse apresentado no Congresso Nacional no
dia 11 de novembro de 2014, cuja mensagem ao Congresso foi redigida
em 5 de novembro de 2014, como consta da proposição apresentada -
que alterou a LDO/2014 (Lei 12.919/2013) e assim dispõe:
LEI
Nº 13.053, DE 15 DE DEZEMBRO DE 2014
Altera
a lei no 12.919, de 24 de dezembro de 2013, que dispõe sobre as
diretrizes para a elaboração e execução da Lei Orçamentária de
2014.
A
PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta
e eu sanciono a seguinte Lei:
Art.
1º A lei no 12.919, de 24 de dezembro de 2013, passa a vigorar com
as seguintes alterações:
“Art.
3º A meta de resultado a que se refere o art. 2º poderá ser reduzida
até o montante das desonerações de tributos e dos gastos relativos
ao Programa de Aceleração do Crescimento - PAC, cujas programações
serão identificadas no projeto e na Lei Orçamentária de 2014 com o
identificador de resultado primário previsto na alínea “c” do
inciso II do § 4o do art. 7o desta lei.
..........”
(NR)
Art.
2º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília,
15 de dezembro de 2014; 193º da Independência e 126º da República.
A partir da aprovação desta lei
a meta fiscal foi reduzida em até R$ 67 bilhões, como se pode
verificar da mensagem ao PLN 36/2014, que diz:
EM nº 00206/2014 MP
Brasília, 5 de Novembro de 2014
Excelentíssima Senhora
Presidenta da República,
- Ao longo de 2014, foi revisada para baixo a previsão de crescimento da economia brasileira para este ano quando comparada à utilizada no início de 2013, para elaboração do Projeto de Lei de Diretrizes orçamentárias de 2014. Esta revisão para baixo da previsão de crescimento tem ocorrido em diversos países, levando instituições e organismos internacionais a revisarem para baixo a estimativa de crescimento da economia mundial para este ano de 2014.
- A redução do ritmo de crescimento da economia brasileira afetou as receitas orçamentárias de forma que se faz necessário garantir espaço fiscal para preservar investimentos prioritários e garantir a manutenção da competitividade da economia nacional por meio de desonerações de tributos. As políticas de incentivos fiscais e a manutenção do investimento tornaram se imprescindíveis para minimizar os impactos do cenário externo adverso e garantir a retomada do crescimento da economia nacional.
- Neste sentido, a proposta encaminhada consiste em ampliar a possibilidade de redução do resultado primário no montante dos gastos relativos às desonerações de tributos e ao Programa de Aceleração do Crescimento -PAC. Para isto propõe-se a alteração da Lei nº 12.919, de 24 de dezembro de 2013, que “Dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e execução da Lei Orçamentária de 2014 e dá outras providências”, que estabelece no caput do art. 3º que a meta de superávit primário poderá ser reduzida em até R$ 67.000.000.000,00 (sessenta e sete bilhões de reais), valores esses relativos às desonerações de tributos e ao Programa de Aceleração do Crescimento -PAC, cujas programações serão identificadas no Projeto e na Lei Orçamentária de 2014 com identificador de Resultado Primário previsto na alínea “c” do inciso II do § 4º do art. 7º desta Lei.
- Diante do exposto, submeto à consideração de Vossa Excelência a anexa proposta de Projeto de Lei que altera o caput do art. 3º da Lei nº 12.919, de 24 de dezembro de 2013, que “Dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e execução da Lei Orçamentária de 2014 e dá outras providências”. (GRIFAMOS).
Portanto, resta comprovado
que a denunciada, desde o dia 5 de novembro de 2014, pelo menos, já
tinha conhecimento de que a meta de superávit primário prevista na
LDO não estava sendo cumprida, e que não seria cumprida,
pois foi apresentado projeto de lei para a alteração da meta do
resultado primário, o que efetivamente ocorreu com a aprovação
da lei, convertido para a Lei 13.053/2014. Mesmo conhecendo a
impossibilidade de cumprir a meta fiscal, a denunciada, após esta
data, expediu os decretos constantes da tabela anexa.
Em sede de Memorial, cuja cópia
segue anexa, o Procurador junto ao Tribunal de Contas da União, Dr.
Júlio Marcelo de Oliveira, claramente evidenciou a prática do crime
em questão:
“Além
das omissões intencionais na edição de decretos de
contingenciamento em desacordo com o real comportamento das receitas
e despesas do país, houve ainda edição de decretos para abertura
de créditos orçamentários sem a prévia, adequada e
necessária autorização legislativa, violando a Lei Orçamentária
anual, a LRF e a Constituição da República” (grifos no
original). (GRIFAMOS)
Como deixa claro o parecer do
ilustre Procurador, a autorização deveria ser prévia!
A
ilegalidade da conduta da denunciada se revela a partir das
proibições constantes do art. 167, V da CF2
e art. 4º da Lei Orçamentária Anual – LOA-2014 (Lei
12.952/2014)3.
O art. 167, inciso V, da
Constituição Federal, estabelece ser vedada a ABERTURA DE CRÉDITO
SUPLEMENTAR sem prévia autorização legislativa e sem indicação
dos recursos correspondentes. Esta autorização tem que constar de
lei específica (art. 165, § 8º da CF).
Com efeito, para a execução do
orçamento em determinado exercício financeiro, como regra, a lei de
diretrizes orçamentárias estabelece as balizas para o manejo de
verbas suplementares. Em 2014, a Lei 12.952/2014, em seu artigo 4º,
autorizou a abertura de créditos suplementares, desde que as
alterações promovidas “sejam compatíveis com a obtenção da
meta de resultado primário estabelecida para o exercício de 2014”.
Ou seja, a abertura de crédito
suplementar não poderia ocorrer se houvesse incompatibilidade com a
meta estabelecida por lei. Como já demonstrado acima, a propositura
do PLN 36/2014 é uma confissão de que a meta não estava e
não seria cumprida.
Diante deste quadro, cumpria à
denunciada atender ao quanto disposto no art. 9º da Lei de
Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000), que dispõe:
“Art. 9- Se verificado, ao
final de um bimestre, que a realização da receita poderá não
comportar o cumprimento das metas de resultado primário ou nominal
estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os Poderes e o Ministério
Público promoverão, por ato próprio e nos montantes necessários,
nos trinta dias subsequentes, limitação de empenho e movimentação
financeira, segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes
orçamentárias”.
Assim, nos termos da legislação
vigente, a denunciada, após constatado o desatendimento à meta de
resultado primário, inclusive por arrecadação a menor em relação
às receitas estimadas, como admitido expressamente em projeto de lei
encaminhado ao Congresso Nacional, tinha a obrigação legal de
limitar os empenhos e a movimentação financeira. Nos termos do art.
4º da LOA/2014, à denunciada era defeso autorizar qualquer valor de
verba suplementar.
Porém, a conduta da denunciada
foi contrária ao que determina a lei. Editou decretos com ampla e
vultosa movimentação financeira, ampliando os gastos da União com
recursos suplementares, quando estava vedada esta ação.
Não bastasse o ocorrido no
ano de 2014, a mesma conduta da denunciada foi praticada no ano de
2015.
Assim é que a denunciada, no
ano de 2015, assinou os seguintes decretos sem número:
Referidos decretos, cuja
publicação no Diário Oficial da União encontra-se comprovada
pelos documentos anexos, importam dotação orçamentária
concernente a suposto Superávit financeiro e excesso de arrecadação,
na ordem de R$ 2,5 bilhões (R$ 95,9 bilhões menos R$ 93,4 bilhões).
Todavia, esses superávit e
excesso de arrecadação são artificiais, pois, conforme se pode
verificar a partir do PLN nº 5/2015, encaminhado ao Congresso
Nacional em 22 de julho de 2015, o Poder Executivo já reconhecera
que as metas estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias, Lei
nº 13.080/2015, não seriam cumpridas.
Ora, o art. 4º da Lei
13.115/2015, Lei Orçamentária anual de 2015, é expresso em prever
que a abertura de créditos suplementares seja compatível com a
obtenção da meta de resultado primário, tal como previsto na
LOA/2014.
Data venia, o PLN 5/2015 é
límpido em dizer que a meta fixada não está sendo atendida, pois
seu objeto é, exatamente, reduzir as metas estabelecidas na LDO e
LOA.
A confissão deste crime
encontra-se na Mensagem ao Congresso deste PLN 05/2015, que diz:
Excelentíssima Senhora
Presidenta da República,
- Encaminhamos para apreciação de Vossa Excelência, proposta de Projeto de Lei alterando a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015, particularmente em relação às metas fiscais.
2.
A previsão de crescimento da economia brasileira para o ano de
2015 foi revisada para baixo nos meses seguintes à
publicação da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2015.
3.
A redução do ritmo de crescimento da economia brasileira afetou
as receitas orçamentárias, tornando necessário garantir espaço
fiscal adicional para a realização das despesas obrigatórias e
preservar investimentos prioritários. De outra parte, não obstante
o contingenciamento de despesas já realizado, houve significativo
crescimento das despesas obrigatórias projetadas.
- Desse modo, considerando os efeitos de frustração de receitas e elevação de despesas obrigatórias, o esforço fiscal já empreendido não será suficiente, no momento, para a realização da meta de superávit primário para o setor público não financeiro consolidado estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentária.
5.
Nesse sentido, propomos a revisão da meta fiscal originalmente
definida, associada à adoção de medidas de natureza
tributária e de novo contingenciamento de despesas que, uma vez
implementadas, propiciarão os meios necessários à continuidade do
ajuste fiscal em curso.
- A esse respeito, merece destaque a ampliação dos esforços dirigidos ao combate à evasão e à sonegação de tributos, bem como a adoção de medidas que privilegiem a recuperação de créditos nas instâncias administrativa e judicial e de outras voltadas ao incremento das receitas tributárias, contribuições e demais receitas. De outra parte, há limitado espaço para medidas de limitação de empenho e de movimentação financeira, sem que se ocasione acentuado prejuízo à continuidade de inúmeras ações essenciais em curso, cujo sobrestamento, em uma análise de custo-benefício, implicaria maiores consequências para a sociedade.
7.
Por certo, a meta de resultado primário encerra conteúdo de
disciplina fiscal do Estado Brasileiro, consentâneo com os ditames
da LRF. Entretanto, ela não deve ser vista como um fim em si mesmo,
admitindo-se que, uma vez esgotados os mecanismos de ampliação da
receita e os meios de limitação de despesas, se proponha,
justificadamente, a sua alteração, tendo por base o
pressuposto da transparência que deve orientar a gestão fiscal.
8.
Nesse sentido, a
sugestão encaminhada consiste em propor como meta um
resultado primário do setor público consolidado equivalente a
R$ 8,7 bilhões, sendo R$ 5,8 bilhões a cargo dos
Orçamentos Fiscal e da Seguridade. Ainda assim, diante do
cenário de incerteza quanto à efetividade da arrecadação
decorrente das referidas medidas tributárias e concessões e
permissões, a proposta define que será reduzido o resultado
proposto, caso os efeitos de arrecadação das referidas medidas,
incluindo algumas em tramitação no Congresso Nacional, se frustrem.
9.
Diante do exposto, submetemos à consideração de Vossa
Excelência a anexa proposta de Projeto de Lei que altera o art.
2ºda Lei nº13.080, de 2 de janeiro de 2015, que dispõe sobre as
diretrizes para a elaboração e execução da Lei Orçamentária de
2015 e dá outras propostas.
Os decretos acima transcritos
foram editados e publicados após a data de propositura do PLN 5/2015
no Congresso Nacional, o que revela o dolo da denunciada!
Idênticas as condutas nos anos
de 2014 e 2015!
As condutas acima descritas
constituem inegável crime de responsabilidade, nos termos do art. 10
da Lei 1.079/50, especificamente nos seguintes itens:
“Art.
10. São crimes de Responsabilidade contra a lei orçamentária:
4)
Infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei
orçamentária;
6)
Ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os
limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei
orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de
prescrição legal”.
Ora, a denunciada, por meio dos
decretos acima mencionados, autorizou, nos anos de 2014 e 2015, a
abertura de crédito com inobservância à LOA e à Constituição
Federal, justamente por permitir a abertura de recursos suplementares
quando já se sabia da inexequibilidade das metas de superávit
estabelecidas por lei, como demonstrado acima.
Sua conduta criminosa é
inequívoca, sendo certo que o Colendo TCU já reconheceu ser ilegal
esta prática nos autos do TC-005.335/2015-9, nos seguintes termos:
“17.1.2.
Abertura de créditos suplementares, entre 5/11/2014 e 14/12/2014,
por meio de Decretos Não Numerados 14028, 14029, 14041, 14042,
13060, 14062 e 14063, incompatíveis com a obtenção da meta de
resultado primário então vigente, em desacordo com o art. 4º da
Lei Orçamentária Anual de 2014, infringindo por consequência o
art. 167, inc. V, da Constituição Federal, e com a estrita
vinculação dos recursos oriundos do excesso de arrecadação ou de
superávit financeiro, contrariando o parágrafo
único do art. 8º da Lei de Responsabilidade Fiscal.”
Esta constatação diz respeito
às práticas ilegais intentadas pela denunciada no ano de 2014. E,
ainda assim, ela reiterou em 2015! O caso é grave!
Em resumo, a mensagem do Poder
Executivo confirma que a frustração nas expectativas de arrecadação
e o aumento de despesas impediram o cumprimento das metas e a
denunciada criou e continua criando despesas suplementares enquanto
as metas vigentes estão comprovadamente desatendidas, o que infringe
os artigos 167, V da CF, art. 4º da LOA/2014 e LOA/2015, e art. 9º
da Lei Complementar 101/2000.
Inegável, portanto, que a
infringência às leis orçamentárias é patente, contumaz e
reiterada, o que perfaz o tipo do art. 10, 4, da Lei 1.079/50.
Ainda, estas mesmas condutas
importam crime de responsabilidade nos termos do item 6, do art. 10,
da Lei dos Crimes de Responsabilidade, pois Dilma Vana Rousseff, no
exercício da Presidência da República, autorizou a abertura de
crédito sem fundamento na lei orçamentária e com inobservância de
prescrição legal. Nota-se, à toda evidência, que a publicação
destes decretos já seria, isoladamente, suficiente para ensejar o
afastamento da Presidente da República, mas, as ilegalidades foram
além, conforme restará evidenciado.
2.2. - Das Práticas Ilegais de
Desinformações Contábeis e Fiscais- As chamadas pedaladas fiscais
Conforme apurado pelo Tribunal de
Contas da União, em processo ainda em andamento (TC 021.643/2014-8),
durante os anos de 2011 e 2014 a contabilidade da União não espelha
a realidade das contas públicas – o que afronta a necessária
transparência -, em razão da prática de diversas maquiagens
contábeis que ficaram conhecidas como “pedaladas fiscais”.
Essa conduta revela que os
princípios inspiradores de Maquiavel estão presentes no Governo
Federal, na medida em que os fins justificaram os meios, pois o
objetivo único e exclusivo das “pedaladas” foi, e ainda é,
forjar uma situação fiscal do país que inexiste, sem o temor de
afrontar a lei para chegar ao resultado esperado.
Do incluso parecer do eminente
Procurador Júlio Marcelo de Oliveira, do Ministério Público no
Tribunal de Contas da União, emitido nos autos do processo nº TC
021.643/2014-8, confere-se que foram praticadas as seguintes
ilegalidades:
A)
Não registro no rol dos passivos da União na Dívida Líquida do
Setor Público valores devidos pela União ao Banco do Brasil
relativos a equalização de juros e taxas de safra agrícola;
B)
Não registro no rol dos passivos da União na Dívida Líquida do
Setor Público valores devidos pela União ao Banco do Brasil
relativos a créditos a receber do Tesouro Nacional em razão de
títulos de créditos não contabilizados;
C)
Não registro no rol dos passivos da União na Dívida Líquida do
Setor Público valores devidos pela União ao BNDES relativos a
equalização de juros do Programa de Sustentação do Investimento
(PSI);
D)
Não registro no rol dos passivos da União na Dívida Líquida do
Setor Público valores devidos pela União ao Banco do Brasil
referentes a passivo da União junto ao FGTS em razão do Programa
Minha Casa Minha Vida;
E)
Incorreta apresentação dos cálculos do resultado primário das
contas do Governo em decorrência de dispêndios ocorridos no âmbito
do Bolsa Família, do Abono Salarial e do Seguro Desemprego, bem como
os dispêndios relativos a equalização de taxa de juros da safra
agrícola e créditos não lançados junto ao Banco do Brasil. Ainda,
essa incorreção também se revelou em razão do não lançamento da
variação dos saldos da dívida da União junto ao FGTS relativos ao
Programa Minha Casa Minha Vida e recursos não repassados pela União
e que estão registrados em referido fundo junto à União, bem como
junto ao BNDES no âmbito do Programa de Sustentação do
Investimento (PSI);
F)
Realização de operações ilegais de crédito por meio da
utilização de recursos da Caixa Econômica Federal para a
realização de pagamentos de dispêndios de responsabilidade da
União no âmbito do Programa Bolsa Família;
G)
Realização de operações ilegais de crédito por meio de
utilização de recursos da Caixa Econômica Federal para a
realização de pagamentos de dispêndios de responsabilidade da
União no âmbito do Seguro-Desemprego e do Abono Salarial;
H)
Realização de operações ilegais de crédito por meio de
adiantamentos concedidos pelo FGTS ao Ministério das Cidades no
âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida, através da Caixa
Econômica Federal;
I)
Realização de operações ilegais de crédito por meio de
utilização de recursos do BNDES no âmbito do Programa de
Sustentação do Investimento (PSI);
J)
Pagamentos de dívidas da União no âmbito do Programa Minha Casa
Minha Vida sem a devida autorização em Lei Orçamentária Anual ou
em Lei de Créditos Adicionais;
K)
Atrasos nos repasses de recursos aos Estados e Municípios em
decorrência da exploração de gás, petróleo e recursos hídricos
(Lei 7.990/89); da contribuição social do salário-educação (art.
212, § 5º da Constituição Federal) e nos repasses de recursos ao
Instituto Nacional de Seguro Social.
Importante esclarecer que a
denúncia ofertada pelo Ministério Público no TCU foi acolhida pelo
Tribunal de Contas da União em acórdão datado de 15 de abril de
2015.
Estas operações ilegais
caracterizam crime de responsabilidade, nos termos do artigo 11,
itens 2 e 3, da Lei 1.079/50.
Com efeito, a União realizou
operações de crédito ilegais a partir do não repasse de recursos
a entidades do sistema financeiro nacional controladas pela própria
União.
Tal prática se deu a partir de
adiantamentos realizados pela Caixa Econômica Federal e Banco do
Brasil, em diversos programas federais de responsabilidade do Governo
Federal.
Como é cediço, adiantamentos de
recursos realizados por entidades do sistema financeiro constituem
efetiva operação de crédito, notadamente para fins da Lei de
responsabilidade fiscal, que assim define o instituto (art. 29, III):
“Art.
29. Para os efeitos desta Lei Complementar, são adotadas as
seguintes definições:
I
- ....
III
- operação de crédito: compromisso financeiro assumido em razão
de mútuo, abertura de crédito, emissão e aceite de título,
aquisição financiada de bens, recebimento antecipado de valores
provenientes da venda a termo de bens e serviços, arrendamento
mercantil e outras operações assemelhadas, inclusive com o uso de
derivativos financeiros;”
Os adiantamentos foram realizados
através da seguinte operação:
A União contratou a Caixa
Econômica Federal e o Banco do Brasil como operadores de programas
desenvolvidos pelo Governo Federal. Para tanto, deveria repassar,
diretamente da conta do Tesouro, os recursos necessários para a
efetivação dos programas a cada mês, mais precisamente, teria a
obrigação de transferir para as instituições financeiras os
valores relativos à equalização de juros, aos dispêndios e às
transferências legais dos já mencionados programas de governo.
Porém, deixou de operar essas
restituições e as entidades do sistema financeiro contratadas
realizaram os pagamentos aos beneficiários com recursos próprios e,
consequentemente, promoveram a constituição de crédito em seu
favor, contra a União.
Este procedimento, a toda
evidência, constitui modalidade de mútuo, ou operação
assemelhada, a configurar operação de crédito nos termos da Lei de
Responsabilidade Fiscal.
Ocorre que o art. 36 da Lei de
Responsabilidade Fiscal proíbe a realização de operação de
crédito entre uma instituição financeira estatal e o ente da
Federação que a controla, na qualidade de beneficiário do
empréstimo.
Outro não foi o ocorrido, eis
que as instituições que concederam crédito, como é público e
notório, são controladas pela própria União.
Logo, a operação de crédito
realizada entre as instituições financeiras e a União foram
ilegais!
Neste ponto, destacamos o
seguinte trecho do parecer da Procuradoria do TCU:
“Não
há dúvida de que, nos casos em que a instituição financeira
efetua, com recursos próprios, pagamento de despesas de
responsabilidade da União, esta assume o compromisso financeiro de
repassar àquela os recursos federais correspondentes, acrescidos dos
encargos financeiros eventualmente acordados entre as partes.
Não
é à toa, pois, que as instituições financeiras públicas
inspecionadas na fiscalização empreendida pela SecexFazenda
registraram, em seus ativos, os valores a receber do Tesouro Nacional
referentes aos pagamentos de despesas de responsabilidade do Governo
Federal.” (GRIFO NO ORIGINAL)
Importante consignar que as
entidades do sistema financeiro estavam autorizadas a funcionar
apenas como operadores do programa, não como agente financiador
(Art. 9º da Lei 11.977/2009 – Minha Casa Minha Vida, por exemplo).
Sobre essa operação, ao receber
a representação oferecida pelo Ministério Público junto ao TCU,
assim entendeu a Corte de Contas:
- No caso das despesas referentes ao bolsa família, ao seguro-desemprego e ao abono salarial, verificou-se que, ao longo de 2013 e dos sete primeiros meses de 2014 (jan. a jul./2014), abrangidos na fiscalização, a Caixa Econômica Federal utilizou recursos próprios para o pagamento dos benefícios de responsabilidade da União. Na verdade, conforme demonstram as tabelas constantes do relatório de fiscalização, as contas de suprimento desses programas na Caixa passaram a disponibilizar um crédito assemelhado ao cheque especial, porquanto seus saldos, ao longo do período fiscalizado, foram quase sempre negativos.
24.
De acordo com informações fornecidas pelo Departamento de
Supervisão Bancária do Bacen, o saldo total desses passivos ao
final do mês de agosto de 2014 era de R$ 1,74 bilhão,
assim composto:
(i)
Bolsa Família: R$ 717,3 milhões; (ii) Abono Salarial: R$ 936,2
milhões; e (iii) Seguro Desemprego: R$ 87 milhões.
25.
Com relação ao PMCMV, os orçamentos aprovados desde o ano de 2010,
bem como o projeto para o ano de 2015, previam que as despesas com as
subvenções econômicas desse programa seriam financiadas com
recursos da chamada “fonte 100”, que representa recursos livres e
ordinários arrecadados pelo Tesouro ao longo do respectivo exercício
financeiro.
26.
Entretanto, o pagamento dessas subvenções de responsabilidade da
União vem ocorrendo por intermédio de adiantamentos concedidos pelo
FGTS, na forma autorizada pelo art. 82-A da Lei 11.977/2009,
utilizando-se a fonte de recursos “operação de crédito interna”.
27.
Desse modo, do montante de R$ 7,8 bilhões despendidos com subsídios
concedidos no programa entre 2009 e 2014, apenas R$ 1,6 bilhão foi
repassado pela União ao FGTS, conforme atestam dados encaminhados
pela CAIXA. Ou seja, dos R$ 7,8 bilhões que deveriam ter sido pagos
aos mutuários, apenas R$ 1,6 foi desembolsado pela União, sendo que
o restante, no montante de R$ 6,2 bilhões, foi pago com recursos do
FGTS, a título de adiantamento.
28.
Note-se que, nesse caso específico, o pagamento de dívidas pelo
FGTS deu-se sem a devida autorização em Lei Orçamentária Anual ou
em Lei de Créditos Adicionais, requerida no art. 167, inciso II, da
Constituição da República e o art. 5º, § 1º, da LRF,
caracterizando a execução de despesa sem dotação orçamentária.
29.
Quanto ao pagamento das despesas correspondentes à subvenção
econômica de equalização de taxa de juros no âmbito do Programa
de Sustentação do Investimento (PSI), que era feito semestralmente,
os atrasos começaram no 2° semestre de 2010, sendo que, a partir de
então, até o 1º semestre de 2014, não houve mais nenhum repasse
da União ao BNDES atinente a tal dispêndio.
30.
Em 10 de abril de 2012, quando o saldo a pagar devido pela União
montava a R$ 6,7 bilhões, foi editada a Portaria 122/2012,
prorrogando por 24 meses o prazo para pagamento das dívidas. A
tabela 15 do relatório precedente mostra que, sem a postergação
estabelecida na mencionada portaria, em junho de 2014, o saldo a
pagar com a equalização da taxa de juros montaria a R$ 19,6
bilhões.
31.
Todas essas movimentações financeiras e orçamentárias
acarretaram, evidentemente, o surgimento de passivos do Governo
Federal junto à Caixa, ao FGTS e ao BNDES, em cujos balanços
constam devidamente registrados tais haveres, a débito do Tesouro
Nacional. Ou seja, no bojo dessas operações, créditos foram
efetivamente auferidos pela União, à margem da Lei Complementar
101/2000 (LRF).
32.
Uma vez caracterizados como operações de crédito, tais
procedimentos violam restrições e limitações impostas pela LRF.
33.
Primeiro, porque, no que se refere aos recursos disponibilizados pela
Caixa e pelo BNDES, envolvem instituições financeiras públicas
controladas pelo ente beneficiário dos valores, contrariando o art.
36 da LRF, segundo o qual é “proibida a operação de crédito
entre uma instituição financeira estatal e o ente da Federação
que a controle, na qualidade de beneficiário do empréstimo”.
Depois, porque não atendem às formalidades requeridas no art. 32 da
referida lei, em especial a necessidade de prévia e expressa
autorização no texto da lei orçamentária para sua contratação,
estabelecida no inciso I do § 1° do referido artigo. E, ainda,
porque, circunstancialmente, infringem a vedação do art. 38, inciso
IV, alínea “b”, da Lei, que proíbe a contratação de crédito
por antecipação de receita no último mandato do Presidente da
República.
34.
Assim, com relação a esse ponto, devem ser acolhidos os
encaminhamentos da SecexFazenda, apresentados resumidamente a
seguir:” (TC N° 021643/2014-8 – Voto Ministro José Múcio –
GRIFAMOS)
O voto proferido pelo Ministro
José Múcio explicita, de forma inquestionável, as ilegalidades
praticadas pelo Governo Federal, destacando-se que as práticas
adotadas não foram meros atrasos, mas sim expediente reiterado,
gerando passivos acumulados, notadamente junto à Caixa Econômica
Federal.
Chegou-se ao ponto de deixar de
repassar ao BNDES os valores devidos em razão do Programa de
Sustentação do Investimento – PSI pelo período de 4 (quatro)
anos.
Mais à frente, afirma o ilustre
relator do TCU:
56. De fato, ainda não
compreendo como é que dezenas de bilhões de
reais em passivos da União tornaram-se imperceptíveis ou
indiferentes aos olhos do Banco Central, não obstante constarem
devidamente registrados nos ativos das instituições credoras e
terem sido rapidamente flagrados pelos auditores do TCU.
57.
Afinal, se as dívidas que escaparam ao controle do Banco Central
tivessem sido detectadas desde o seu surgimento, as irregularidades
apontadas neste processo provavelmente não ganhariam grandes
proporções nem se estenderiam por tanto tempo.
58.
Observo que a responsabilidade da Autoridade Monetária de apurar os
resultados fiscais da União é derivada das leis de diretrizes
orçamentárias e fixada pelo próprio Governo Federal, mediante
indicação do Presidente da República, que detém o poder
hierárquico.’ (Grifou-se)
Dentre as operações de crédito
ilegais realizadas pela denunciada merece destaque aquela concernente
à equalização de juros do plano safra.
No acórdão 0825/2015 do TCU,
nos autos do processo TC 021.643/2014-8, consta do voto do Ministro
José Múcio, aprovado por unanimidade:
“116.
As equalizações, como já evidenciado pelos itens 90 a 95
desta instrução, são despesas orçamentárias correntes que
devem ser pagas ao longo do processo de execução do orçamento.
Ou seja, espera-se que o devedor (União) efetue, periodicamente, o
pagamento das equalizações ao respectivo credor (BB).
117.
Quando, no entanto, referidos pagamentos não são efetuados e, ao
estoque da respectiva dívida, passam a ser apropriados juros, não
há dúvida de que o credor está concedendo uma espécie de
financiamento ao devedor.
118.
Desse modo, como determina a metodologia de apuração "abaixo
da linha", nos parece que estão plenamente atendidos os
critérios estabelecidos pela metodologia "abaixo da linha"
para o registro de tais passivos na DLSP, uma vez que: (i) existe o
financiamento concedido pelo BB à União; (ii) os montantes já são
devidos pela União ao BB - ora, se não são devidos, por que são
apropriados juros aos respectivos estoques; e (iii) os
valores estão registrados no ativo da instituição financeira.”
No caso deste programa, há
prova inquestionável das pedaladas fiscais no ano de 2015, através
das demonstrações contábeis do Banco do Brasil do 1º Trimestre de
2015, em que consta a evolução dos valores devidos pelo tesouro
nacional a tal instituição financeira em aproximadamente 20% (vinte
por cento) do montante devido em dezembro de 2014. É que no 4º
balanço trimestral de 2014 a dívida sob esta rubrica era de R$ 10,9
bilhões, passando para R$ 12,7 bilhões em 31 de março de 2015.
Aliás, é da própria nota de
rodapé da demonstração contábil, às fls. 87 e 88, que consta a
confissão do crime praticado, nos seguintes termos: “As transações
com o Controlador referem-se às operações de alongamento de
crédito rural – Tesouro Nacional (Nota 11ª), equalização de
taxas – safra agrícola, títulos e créditos a receber do Tesouro
Nacional”.
Não bastasse, com a
divulgação das demonstrações contábeis do Banco do Brasil do
Primeiro Semestre de 2015, chega-se à prova de que as ilegalidades
do Governo Federal em relação ao Plano Safra se estenderam até
junho de 2015, pois o valor devido ao Tesouro Nacional por
equalização da taxa de juros pelo Plano Safra alcança a cifra de
R$ 13,4 bilhões.
Ou seja, apenas com o Banco do
Brasil, graças a um único programa, as pedaladas fiscais no ano de
2015 foram de mais de R$ 3 bilhões.
Em relação às provas das
ilegalidades aqui narradas, junta-se a esta denúncia mídia digital
em que constam todas os pareceres técnicos do TCU reconhecendo as
ilegalidades. Nem se diga que o processo em questão ainda não foi
analisado pela Corte de Contas, pois esta faz apuração em sua
esfera de Competência, não sendo condição para o reconhecimento
de crime de responsabilidade pela denunciada. As provas ora
carreadas, juntamente com aquelas que abaixo se pleiteiam, por não
estarem acessíveis aos denunciantes neste momento, são suficientes
para a prova dos fatos alegados.
Constatada essa ilegalidade, a
prática de crime de responsabilidade é inequívoca, porquanto,
determina
a Constituição Federal, em seu artigo 85:
Art.
85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da
República que atentem contra a Constituição Federal e,
especialmente, contra:
I
- a existência da União;
II
- o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário,
do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da
Federação;
III
- o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV
- a segurança interna do País;
V
- a probidade na administração;
VI
- a lei orçamentária;
VII
- o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
Parágrafo
único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que
estabelecerá as normas de processo e julgamento.
A
Lei 1.079/50 dá concretude material e formal a esse dispositivo
constitucional, estatuindo, em seu artigo 4º.:
Art.
4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da
República que atentarem contra a Constituição Federal, e,
especialmente, contra:
I
- A existência da União:
II
- O livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos
poderes constitucionais dos Estados;
III
- O exercício dos direitos políticos, individuais e sociais:
IV
- A segurança interna do país:
V
- A probidade na administração;
VI
- A lei orçamentária;
VII
- A guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos;
VIII
- O cumprimento das decisões judiciárias (Constituição, artigo
89).
Tanto
a Constituição Federal, assim como o artigo 4º. da Lei 1.079/50,
dizem ensejar o impedimento do Presidente da República o fato de
este atentar contra a probidade na Administração e contra a lei
orçamentária.
No
entanto, por força de alterações ocasionadas pela Lei 10.028/00, a
clareza da ocorrência do crime de responsabilidade resta ainda
maior. De fato, a lei em apreço (que foi editada para melhor
proteger os valores tutelados pela Lei de Responsabilidade Fiscal),
alterou o artigo 10 da Lei 1.079, o qual passou a vigorar com a
seguinte redação:
1-
Não apresentar ao Congresso Nacional a proposta do orçamento da
República dentro dos primeiros dois meses de cada sessão
legislativa;
2
- Exceder ou transportar, sem autorização legal, as verbas do
orçamento;
3
- Realizar o estorno de verbas;
4
- Infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei
orçamentária.
5)
deixar de ordenar a redução do montante da dívida consolidada, nos
prazos estabelecidos em lei, quando o montante ultrapassar o valor
resultante da aplicação do limite máximo fixado pelo Senado
Federal; (Incluído
pela Lei nº 10.028, de 2000)
6)
ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os
limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei
orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de
prescrição legal; (Incluído
pela Lei nº 10.028, de 2000)
7)
deixar de promover ou de ordenar na forma da lei, o cancelamento, a
amortização ou a constituição de reserva para anular os efeitos
de operação de crédito realizada com inobservância de limite,
condição ou montante estabelecido em lei; (Incluído
pela Lei nº 10.028, de 2000)
8)
deixar de promover ou de ordenar a liquidação integral de operação
de crédito por antecipação de receita orçamentária, inclusive os
respectivos juros e demais encargos, até o encerramento do exercício
financeiro; (Incluído
pela Lei nº 10.028, de 2000)
9)
ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de
operação de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação,
inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que na
forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida
contraída anteriormente; (Incluído
pela Lei nº 10.028, de 2000)
10)
captar recursos a título de antecipação de receita de tributo ou
contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido; (Incluído
pela Lei nº 10.028, de 2000)
11)
ordenar ou autorizar a destinação de recursos provenientes da
emissão de títulos para finalidade diversa da prevista na lei que a
autorizou; (Incluído
pela Lei nº 10.028, de 2000)
12)
realizar ou receber transferência voluntária em desacordo com
limite ou condição estabelecida em lei. (Incluído
pela Lei nº 10.028, de 2000)
É
importante consignar que o simples fato de ter a Presidente
descumprido os comandos dos artigos 36 e 38 da Lei de
Responsabilidade Fiscal já seria suficiente para caracterizar o
crime de responsabilidade, mas, como ela descumpriu dispositivos
claramente descritos na Lei n; 1.079/50, também está sujeita às
consequências do Impeachment, segundo pontifica autorizada doutrina:
“A
recentíssima Lei 10.028, de 19 de outubro de 2000, tipificou os
comportamentos que passam a ser crimes. Já não haverá mera
infração administrativa, no caso de descumprimento das
determinações legais. Passa o comportamento do agente público a
ter tal relevância no setor financeiro que o descumprimento das
normas estabelecidas na lei de responsabilidade fiscal não só
enseja sanção civil, como passa, agora, a constituir crime. Em
sendo assim, há a infração política, que pode ensejar o
impeachment, mediante julgamento pelo Legislativo, bem como há
a infração civil, que enseja indenizações e cassação e mandato
através do Judiciário, bem como passa a existir o crime de caráter
financeiro” (Regis Fernandes de Oliveira. Responsabilidade
Fiscal. 2ª Ed. São Paulo: RT, 2002. p. 105 e 106).
“Quando
o autor da conduta for o Presidente da República, cometerá
igualmente
crime de responsabilidade, conforme dispõe o art. 10 da Lei n.
1.079/50, alterada pela Lei n. 10.028/2000. Note que os “crimes de
responsabilidade” definidos no Diploma aludido não têm natureza
penal (mas político-administrativa), a despeito de sua terminologia,
motivo por que a imputação ao mandatário da Nação do crime
capitulado no art. 359-A do CP e do ato descrito na Lei n. 1079/50
não configurará bis
in idem” (André
Estefam. Direito Penal – Parte Especial (arts. 286 a 359-H)- Volume
4, São Paulo: Saraiva, 2011. p. 437).
Além de ter violado o artigo 10
da Lei 1.079/50, a Presidente incidiu no art. 11 do mesmo diploma
legal, que reza:
“Art. 11. São crimes contra a
guarda e legal emprego dos dinheiros públicos:
1 - .................
2 - Abrir crédito sem fundamento
em lei ou sem as formalidades legais;
3 - Contrair empréstimo, emitir
moeda corrente ou apólices, ou efetuar operação de crédito sem
autorização legal;”
É clara, portanto, a realização
de crime de responsabilidade no presente caso diante da literalidade
dos artigos supracitados, pois houve efetiva realização de abertura
e operação de crédito, além de contração de empréstimo ao
arrepio da lei.
Os empréstimos foram concedidos
em afronta ao art. 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que proíbe
a tomada de empréstimo pela União de entidade do sistema financeiro
por ela controlada.
A toda evidência, as operações
de crédito, na forma aqui narrada, não observaram as formalidades
legais, contrariando a legislação vigente. Logo, há crime de
responsabilidade da Presidente da República, nos exatos termos dos
artigos acima transcritos.
Merece destaque, ainda, que os
ilegais empréstimos havidos no ano de 2015, em razão da equalização
de juros do Plano Safra, deixam ainda mais patente a conduta
delituosa da denunciada. Caberia à Presidente Dilma Rousseff, como
superior hierárquica do Governo Federal, agir para que essa
ilegalidade fosse cessada, o que não fez. Valendo recordar que fora
alertada por várias autoridades, ainda no curso de 2014 e também em
2015.
O aumento da dívida do Tesouro
Nacional com o Banco do Brasil, referente a benefício cujo pagamento
é de responsabilidade da União, consubstancia continuidade do
ilegal financiamento do Governo Federal, não podendo a denunciada
alegar que desconhecia a irregularidade diante da notoriedade dos
fatos desde o ano de 2014, com o início do processo TC 021.643/2014
no TCU.
A conduta da denunciada, Dilma
Rousseff, na concretização destes crimes, é de natureza comissiva,
pois se reunia, diariamente, com o Secretário do Tesouro Nacional,
determinando-lhe, agir como agira. A este respeito, cumpre lembrar
que a Presidente é economista e sempre se gabou de acompanhar
diretamente as finanças e contas públicas. Aliás, durante o pleito
eleitoral, assegurou que tais contas estavam hígidas.
Ainda que a Presidente não
estivesse ativamente envolvida nesta situação, restaria sua
responsabilidade omissiva, pois descumpriu seu dever de gestão da
administração pública federal, conforme art. 84, II, da
Constituição Federal. Abaixo, em item específico, resta melhor
caracterizada a responsabilidade da denunciada no que se refere a
suas condutas omissivas.
2.3. - Do não Registro de
Valores no Rol de Passivos da Dívida Líquida do Setor Público-
Crime de Responsabilidade capitulado no artigo 9º. da Lei 1.079/50;
Outra ilegalidade constatada foi
a falta de registro dos passivos decorrentes das operações de
crédito realizadas, operações essas que se encontram devidamente
detalhadas no item anterior, no rol das dívidas de Passivos da
Dívida Líquida do Setor Público.
Essa operação foi admitida pelo
próprio Banco Central do Brasil, conforme documento datado de 28 de
agosto de 2014 juntado no processo do Tribunal de Contas da União já
referido, cuja cópia segue anexa em mídia digital.
Tal ato afronta a Lei
Orçamentária Anual – LOA, na medida em que impede o efetivo
acompanhamento das contas de Governo, pois parte expressiva do
passivo deixa de ser registrada, com o que o acompanhamento das metas
de superávit primário passa a ser uma ficção.
O art. 5º, I da Lei de
Responsabilidade Fiscal e seu § 1º exigem que os programas dos
orçamentos sejam compatíveis com as metas previstas no art. 4º, §
1º, dessa mesma lei, ou seja, com a apuração dos resultados
primário e nominal e com o montante da dívida pública. Ainda, é
obrigatório que todas as despesas relativas à dívida pública
constem da lei orçamentária anual.
O procedimento adotado pelo
Governo Federal impediu o atendimento a tais normas, de forma
voluntária, como reconhece o ilustre Procurador do TCU Júlio
Marcelo de Oliveira:
“O
contrário, porém, não vinha sendo feito, ou seja, os passivos da
União oriundos dos referidos atrasos não estavam sendo computados
na Dívida Líquida do Setor Público (DLSP), a qual é calculada
mensalmente pelo Banco Central e serve de base à apuração dos
resultados primário e nominal, para fins de avaliação do
cumprimento das metas fiscais estabelecidas na lei de diretrizes
orçamentárias (art. 4º, § 1º, da LC 101/2000).
O
impacto dessas operações na dívida liquida e, consequentemente,
nos resultados fiscais só era captado pelo Bacen no momento do
efetivo desembolso dos recursos federais, isto é, no momento em que
os valores eram sacados da Conta Única do Tesouro Nacional em favor
das instituições financeiras.
No
caso das despesas referentes ao bolsa família, ao seguro-desemprego
e ao abono salarial, a equipe de auditoria verificou que, ao longo do
exercício de 2013 e dos sete primeiros meses do exercício de 2014
(jan a jul./2014), a Caixa Econômica Federal utilizou recursos
próprios para o pagamento dos benefícios de responsabilidade da
União, uma vez que esta, em regra, só repassava os respectivos
recursos financeiros àquela no início do mês subsequente ao do
pagamento.
Como
tais despesas, em razão da metodologia equivocada adotada pelo
BACEN, só estavam produzindo impacto sobre a dívida líquida
(=obrigações-haveres) no momento do desembolso dos recursos pela
União (redução dos haveres),
o resultado fiscal (variação da dívida líquida, segundo o método
‘abaixo da linha’) calculado pelo Bacen ao final de cada mês foi
superior ao que efetivamente seria devido.”
Ao desrespeitar a lei
orçamentária anual de forma deliberada, como consta do parecer
acima, mascarando o orçamento para dele fazer constar informações
incorretas, com apresentação de um resultado fiscal, ao final de
cada mês, superior ao que efetivamente seria adequado, mais uma vez,
a denunciada incorreu em crime de responsabilidade, nos termos do
art. 10, 4 da Lei 1.079/50, que dispõe:
“Art.
10. São crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária:
1-
.............
.................
4
- Infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei
orçamentária.”
Como se pode verificar dos fatos
narrados acima, a lei orçamentária foi acintosamente infringida
desde a sua origem, pois, por ação deliberada do Governo Federal,
os dispositivos da lei orçamentária foram, direta e indiretamente,
inobservados.
Diretamente, por meio da obtenção
de resultados superiores ao efetivo, através de manobras que
esconderam dívidas da União em relação às quais não havia
dúvidas.
Indiretamente, pelo fato de a lei
de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária anual serem
elaboradas com base em resultados e metas que não espelham a
realidade. Embora indireta, esta infração também é explícita.
Com isso, desde a elaboração
das leis orçamentárias, cujas metas e resultados foram baseados em
números que não espelhavam, e ainda não espelham, a realidade, até
a execução da lei orçamentária anual e atendimento às metas
constantes da lei de diretrizes orçamentárias, não há
fidedignidade nas informações, por ato do próprio Governo, o que
leva à conclusão inevitável de que “houve patente infração a
dispositivo da lei orçamentária”.
Além dessa não contabilização
ferir, uma vez mais, o orçamento, cabe lembrar que essa não
contabilização fere a probidade na administração, o que, nos
termos do artigo 9, item 7, da Lei 1.079/50, constitui crime de
responsabilidade, haja vista a afronta à dignidade, honra e decoro
do cargo.
Com efeito, como evidenciado em
sede de Representação Criminal encaminhada à Procuradoria Geral da
República, ao fazer empréstimos proibidos e não os contabilizar, a
Presidente da República poderia até, em tese, ser inclusa nas iras
do artigo 299 do Código Penal, que tipifica a falsidade ideológica.
A situação resta ainda mais
grave, quando se constata que todo esse expediente fora intensificado
durante o ano eleitoral, com o fim deliberado de iludir o eleitorado.
Daí ser possível falar em verdadeiro estelionato eleitoral.
3.- Da responsabilidade da
denunciada
3.1. - Da Natureza Jurídica do
Processo de Impeachment
Para a aferição da
responsabilidade da denunciada é necessário ter em mente a natureza
jurídica do processo de impeachment, de modo a se saber quais são
os elementos necessários a esse fim.
O Supremo Tribunal Federal já,
há muito, definiu esse instituto como de conteúdo
político-administrativo, muito embora tenha inegável vinculação
jurídica. Nesse sentido, vejamos as palavras do Ministro Celso de
Mello quando do julgamento de Mandado de Segurança impetrado por
Fernando Collor de Mello, por força do processo de impeachment, que
resultou em sua destituição do cargo e inabilitação para o munus
publico:
“Tal
circunstância, no entanto, não desveste o instituto do impeachment
de sua natureza essencialmente política. Cumpre ter presente, neste
ponto, a advertência daqueles que, como THEMÍSTOCLES BRANDÃO
CAVALCANTI, acentuam que esse instituto caracteriza processo político
tanto no direito público americano como no direito público
brasileiro, não assumindo, em consequência, a conotação de
processo penal ou de procedimento de natureza quase-criminal.” (STF
- Mandado de Segurança nº 21.623-9, Rel. Min. Carlos Velloso, j.
17-12-1992, Plenário, DJ 28-5-1993).
Este é, também, o entendimento
de Alexandre de Moraes, conforme consta de sua doutrina, in verbis:
“Crimes
de responsabilidade são infrações político-administrativa
definidas na legislação federal, cometidas no desempenho da função,
que atentam contra a existência da União, o livre exercício dos
Poderes do Estado, a segurança interna do país, a probidade da
Administração, a lei orçamentária, o exercício dos direitos
políticos, individuais e sociais e o cumprimento das leis e das
decisões judiciais.” (Constituição do Brasil Interpretada. São
Paulo: 2013, Atlas, pg. 1263)
Outra não é a lição de Gilmar
Ferreira Mendes:
“No
caso do Presidente da República, os crimes de responsabilidade
caracterizam-se como infração político-administrativas que dão
ensejo à perda do cargo e à inabilitação para o exercício de
função pública pelo prazo de oito anos (CF, art. 52, parágrafo
único),” (Curso de Direito Constitucional. São Paulo: 2014,
Saraiva, p. 942)
O efeito pragmático desta
definição é bem delineado por Ives Gandra Martins em recente
parecer elaborado por solicitação do advogado José de Oliveira
Costa, do qual se extrai:
“É
que o julgamento da Suprema Corte difere do julgamento do Congresso
Nacional, aquele apenas voltado para os aspectos jurídicos do
‘impeachment’ e este para os aspectos exclusivamente políticos e
de governabilidade.”
No mesmo sentido, ainda, a lição
sempre atual do ex-Ministro Paulo Brossard, cuja perspicácia
jurídica e notável saber fará grande falta ao direito pátrio:
“Entre
nós, porém, como no direito norte-americano e argentino, o
‘impeachment’ tem feição política, não se origina senão das
causas políticas, objetiva resultados políticos, é instaurado sob
considerações de ordem política e julgado segundo critérios
políticos (...).” (Comentários à Constituição de 1967. São
Paulo: 6º edição, RT, pg. 75).
Ainda no pensamento jurídico do
Ministro Celso de Mello, observamos este mesmo entendimento:
“Os
aspectos concernentes à natureza marcadamente política do instituto
do impeachment, bem assim o caráter político de sua motivação e
das próprias sanções que enseja, não tornam prescindível a
observância da formas jurídicas, cujo desrespeito pode legitimar a
própria invalidação do procedimento e do ato punitivo dele
emergente”.
Não se pode esquecer que o
Supremo Tribunal Federal, em mais de uma oportunidade, reconheceu o
caráter penal do crime de responsabilidade, como, por exemplo, na
ADI 834, Rel. Min. Sepúlveda Pertence.
Essa compreensão não se
contrapõe à conclusão acima no que se refere à natureza jurídica
do processo de impeachment.
É que neste precedente (ADI 834)
se definiu a natureza penal do crime de responsabilidade no tocante à
definição do tipo, que se dá por meio da lei especial a que se
refere o art. 85, parágrafo único, da Constituição Federal.
Assim, compete, exclusivamente,
ao Poder Legislativo Federal aprovar as leis que definam os crimes de
responsabilidade, quer seja para as infrações praticadas pelo
Presidente da República, vice-Presidente da República, Ministros de
Estado, Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal ou
membros do Supremo Tribunal Federal; quer dos Governadores e
vice-Governadores de Estado; quer dos Prefeitos e vice-Prefeitos.
Essa definição não altera a
natureza política do julgamento a ser realizado pelo Senado Federal
e a aceitação da denúncia pela Câmara dos Deputados, mesmo porque
não há como transformar órgãos essencialmente políticos, como
são as assembleias legislativas, em órgãos jurisdicionais.
Parlamentares são seres
políticos desde a origem. O ingresso na vida política por meio dos
partidos políticos – que, aliás, é vedado aos membros do Poder
Judiciário-; a sujeição de seu nome ao crivo popular; o exercício
das atividades como legislador e fiscalizador do Poder Executivo são
atividades essencialmente políticas, a revelar que a motivação e o
conceito de julgamento dos “juízes” no processo de impeachment
são exclusivamente políticos, apesar do sólido respaldo jurídico
demonstrado nesta denúncia.
Como evidenciado nos precedentes
doutrinários e jurisprudenciais acima, o caráter jurídico do
processo de impedimento está exclusivamente na forma, por meio da
qual se observarão os procedimentos definidos em lei e nos
regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com
especial destaque para as normas processuais constitucionais,
notadamente o direito ao contraditório, ampla defesa e devido
processo legal.
Porém, mesmo que admitida a
natureza penal do processo de impeachment, fazemos nossas as palavras
do ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso, que assim
se manifestou no MS 21.623-9:
“Posta
assim a questão, quer se entenda como de natureza política o
‘impeachment’ do Presidente da República, ou de natureza
político-penal, certo é que o julgamento, que ocorrerá perante o
Senado Federal, assim perante um Tribunal político, há de observar,
entretanto, determinados critérios e princípios, em termos
processuais, jurídicos. Esta afirmativa, quer-me parecer, tem o
endosso de Paulo Brossard”.
Portanto, o reconhecimento dos
elementos necessários ao impedimento do Presidente da República é,
sempre, um juízo político, não sujeito às garantias inerentes às
decisões de cunho jurisdicional – exceção feita à forma
processual -, cabendo ao parlamentar que se defronta com o processo
de impeachment julgar segundo sua própria consciência.
Tanto é certo que, fosse a
admissão do processo, a ser realizada pela Câmara dos Deputados, e
o julgamento do processo de impeachment, de competência do Senado
Federal, de natureza jurisdicional, cada voto de parlamentar deveria
ser fundamentado, nos termos do art. 93, IX da Constituição
Federal, o que não se exige, justamente, por ser político e não
jurídico o seu voto.
A natureza preponderantemente
política do processo de impeachment permite que os parlamentares,
inclusive, levem em consideração ilícitos que venham a ser
desvendados, após a apresentação da denúncia, sem necessidade de
aditamento. No caso da denunciada, infelizmente, a cada dia, as
ilicitudes aumentam, seja no que tange às afrontas ao orçamento,
seja no que concerne à condescendência para com práticas
corruptas, seja relativamente à tentativa reiterada de desqualificar
seus críticos e aqueles que se valem dos instrumentos legais para
bem defender o país. Uma vez mais, cumpre lembrar que a Presidente
entrega seu governo a um ex-Presidente, que precisa explicar à nação
sua riqueza acumulada.
3.2. - Da Omissão Dolosa.
O mandatário é, antes de mais
nada, um gestor. Como gestor tem o dever jurídico de envidar todos
os seus esforços para bem gerir. No caso do gestor público, esses
esforços devem direcionar-se à perseguição do interesse público.
No limite de sua
discricionariedade, o gestor público opta pelos valores e rumos do
Governo, porém, suas ações devem ser pautadas, entre outros, pelo
princípio da legalidade, sempre fazendo aquilo, e somente aquilo,
que a lei exige; e o princípio da moralidade, qualidade inerente
somente a quem age de forma proba.
O preâmbulo da Constituição
Federal explicita que os representantes do povo brasileiro se
destinam a “assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos
(...)”.
Ora, se assim o é, o agente
público ocupante de cargo eletivo, ao representar o povo brasileiro,
tem um dever, uma obrigação, que é assegurar o exercício de
direitos. A ideia de garantir os direitos revela que antes de um
direito conquistado nas urnas, a denunciada tem para com o titular da
soberania nacional uma responsabilidade, a qual deveria assumir e
exercer com diligência.
Ainda, a Carta Magna de 1988, com
a Emenda Constitucional nº 19/98, exige dos agentes públicos
eficiência. É o que consta do art. 37, caput, que dispõe:
“A
administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”
Logo, sempre que um mandatário
toma posse de seu cargo, tem o dever de ser eficiente, o que lhe
exige diligência e perícia no trato com a coisa pública.
E mais, conforme dispõe o art.
78 da Constituição Federal, ao tomar posse, o Presidente da
República assume o compromisso, dentre outros, de “promover o bem
geral do povo brasileiro”.
Ora, somente poderá fazê-lo se
agir de forma responsável em seu cargo, assumindo, inclusive, a
responsabilidade por suas omissões.
Como já demonstrado nesta
explanação, são diversas as condutas da Presidente Dilma Rousseff
que evidenciam sua irresponsabilidade.
Em relação aos fatos narrados
acima, há elementos mais do que suficientes para se reconhecer que a
denunciada praticou crime de responsabilidade.
Com efeito, constituem crime de
responsabilidade a ação e a omissão da Presidente da República no
tocante ao que se chama de “pedaladas fiscais”.
Diz o Procurador no TCU Júlio
Marcelo de Oliveira em seu parecer no processo TC nº 021.643/2014-8:
“Cumpre
salientar que as dívidas da União que deixaram de ser devidamente
captadas pelo Bacen, identificadas durante a inspeção, alcançaram
mais de R$ 40 bilhões (...)”
Nobres Parlamentares,
inacreditavelmente, a denunciada deixou de perceber que mais de R$ 40
bilhões de reais não foram lançados na dívida da União,
comprometendo os dados oficiais do Governo Federal, o estabelecimento
de metas, o cumprimento das metas fiscais e, via de consequência, o
atendimento à lei de diretrizes orçamentária e à lei orçamentária
anual.
Não se pode olvidar que é da
responsabilidade da Presidente da República enviar ao Congresso
Nacional a LDO e a LOA, conforme art. 84, XXIII da Constituição
Federal. Ao assinar essas leis, a Presidente assume como reais os
números e estimativas ali constantes, explicitando todo seu
conhecimento sobre a matéria.
Porém, dois elementos tornam
incontroverso seu conhecimento dos fatos.
Primeiro, há mais de dois anos
que a imprensa nacional alerta o Governo de que a contabilidade
pública está sendo maquiada. Aliás, foi este o motivo que levou o
MP do TCU a agir para fiscalizar este fato, como consta do parecer do
Procurador Júlio Marcelo de Oliveira:
“Trata-se
de representação formulada por este Procurador do Ministério
Público de Contas (peça 1) em razão de indícios de
irregularidades, noticiados em jornais e revistas de grande
circulação no país (peça 3), relacionados ao atraso no repasse às
instituições financeiros dos valores destinados ao pagamento de
despesas de responsabilidade da União, tais como o bolsa família, o
abono salarial, o seguro-desemprego, os subsídios de financiamento
agrícola e os benefícios previdenciários,”
O conhecimento do fato é
inegável, pois as informações foram fartas sobre o tema.
Em segundo lugar, no final do ano
de 2014 a Presidente da República encaminhou para o Congresso
Nacional o PLN nº 36, de 2014, para alterar a LDO visando modificar
as regras do superávit primário.
Ao fazê-lo, a Presidente Dilma
Rousseff demonstrou ter conhecimento dos resultados das contas
públicas e que tomou as providências necessárias para
regularizá-las. Porém, o fez apenas para atender a seu interesse,
pois, como é sabido, visou evitar que fosse acusada de crime de
responsabilidade por não cumprir as metas fiscais estabelecidas em
lei.
Não é preciso grandes
elucubrações para sabermos que a denunciada sabia destes fatos.
Quem já foi prefeito ou governador, quem já participou diretamente
da administração pública, sabe que o alcaide de um Município, o
governador de um Estado, acompanha diariamente o resultado das contas
públicas. O mesmo se dá com o Presidente da República.
Registre-se, por oportuno, que o
principal autor das pedaladas fiscais, o então Secretário do
Tesouro Nacional, Arno Augustin, sempre manteve uma relação de
estreita proximidade com a denunciada, o que, inclusive, despertava
incômodos na equipe de governo de Dilma Rousseff.
Esta proximidade foi destacada
pelo jornal Folha de São Paulo em matéria de 03 de novembro de
2014, nos seguintes termos:
EQUIPE
DE DILMA TEME AUMENTO DE PODER DE ARNO AUGUSTIN EM 2015
Atual
secretário do Tesouro Nacional deve assumir cargo de assessor
especial da Presidência
Arno
Augustin deve ter novo endereço em 2015. A possível mudança tem
deixado integrantes do próprio governo Dilma preocupados.
O
atual secretário do Tesouro Nacional deve assumir, a partir do
próximo ano, o cargo de assessor especial da Presidência, com
direito a sala ao lado do gabinete presidencial no Planalto.
Funcionários
do alto escalão dizem achar que, caso assuma a nova função, Arno
será uma espécie de "grilo falante", dando ideias à
presidente não só na agenda macroeconômica, mas também na micro.
Ou seja: sua influência aumentará em 2015.
Tirando
a presidente, Arno Augustin tornou-se uma unanimidade no primeiro
mandato: é, ao mesmo tempo, desaprovado pelo mercado financeiro e
pelo próprio PT, partido ao qual é filiado.
Nos
últimos anos, Arno ganhou lugar cativo no time dos mais fieis
auxiliares de Dilma. Agora, se confirmada a remoção, pode virar
conselheiro de tudo, do prometido projeto que unifica alguns impostos
às discussões sobre cortes no Orçamento.
Na
avaliação interna, Arno simboliza a imagem negativa do governo na
gestão fiscal, marcada pelas manobras adotadas a partir de 2012 para
"garantir" o cumprimento das metas. Mas não é só.
Exageros
à parte, muitos afirmam que vêm dele atrasos relevantes na agenda
do programa de concessões públicas, lançado em 2012.
De
fato, Arno influenciou quase tudo o que se produziu no Executivo nos
últimos anos: renovação das concessões de energia; leilões de
aeroportos, redistribuição de slots (janelas para pousos e
decolagens) em Congonhas; novo modelo de ferrovias, rodovias entre
outros.
Em
muitos desses casos, extrapolou sua atribuição de guardião do
cofre público, sugerindo ele próprio gastos adicionais que
comprometeriam a capacidade do governo de economizar para pagar os
juros da dívida pública.
Exemplos
não faltam. Ele mesmo se ofereceu para bancar parte da indenização
às geradoras de energia que se recusaram a renovar suas concessões
seguindo as regras impostas pelo Planalto.
Também
saiu de seu escaninho a proposta de criar um subsídio para estimular
a aviação regional.
Na
ocasião, especialistas do próprio governo ponderaram que a medida
não era a ideal para promover mais voos ao interior. Arno, então,
bateu o pé e conseguiu convencer a presidente.
UNHA
E CARNE
Observadores
da relação de Arno com a chefe costumam descrevê-los como
semelhantes. O secretário não costuma contradizer Dilma. Executa a
tarefa pedida, com raríssimos questionamentos.
Quando
o Planalto analisava a segunda rodada de licitações de aeroportos,
depois das concessões de Guarulhos, Viracopos e Brasília, Arno
convenceu a presidente a mudar o modelo de leilão, quando ministros
viajaram ao exterior com a missão de "vender" o projeto a
operadores internacionais.
A
mala, como era imaginado, voltou vazia. Arno jamais foi cobrado
disso. O Planalto perdeu meses nessa discussão. A segunda rodada de
licitações acabou saindo no mesmo formato da primeira. (Grifamos)
A
definição da proximidade entre Dilma e o mentor das pedaladas
fiscais fica assim resumida: “Unha e Carne”! Também esta
proximidade impede a denunciada de negar o conhecimento do que se
passava, e ainda se passa, com as contas governamentais.
Assim, os atos ilícitos
praticados na condução das contas públicas, comprovados à
saciedade no item 2.1 acima, são de responsabilidade da denunciada,
razão pela qual responde pelos crimes de responsabilidade previstos
no art. 10 da Lei 1.079/50.
Da mesma forma, a
responsabilidade da denunciada quanto à corrupção sistêmica de
seu Governo é inegável.
O volume da corrupção, já
reconhecido por órgãos de investigação e pelo Ministério Público
como o maior escândalo já descoberto no país, superando,
inclusive, o Mensalão, que levou inúmeros próceres do Partido dos
Trabalhadores – PT para a cadeia, é demasiadamente vultoso para se
admitir o simples desconhecimento por parte da Presidente da
República. Como consignado quando da narração dos fatos, causa
espécie a insistência da Presidente em negar o inegável, em
defender, por exemplo, o ex-presidente Lula, conferindo-lhe plenos
poderes de gestão.
Só na Petrobrás, os desvios de
recursos superam, até agora, R$ 6 bilhões de reais, como admitido
pela própria estatal em seu balanço recentemente divulgado.
A condição de Presidente do
Conselho de Administração da Petrobrás entre os anos de 2003 e
2010 não permite que a denunciada apenas negue não saber da
corrupção existente, principalmente quando, nos termos do Regimento
Interno do Conselho de Administração da Petrobrás, clausula 3.1.3,
é responsabilidade dos conselheiros realizar a fiscalização da
gestão dos diretores, lembrando que foram em duas diretorias que os
desvios ocorreram de forma contundente e vultosa.
O volume e a sistemática da
corrupção, como revelado por Alberto Yousseff e Paulo Roberto da
Costa em suas delações premiadas, bem como Pedro Barusco e outros,
deixa claro que o desconhecimento destes fatos por membros da
diretoria da Petrobrás ou pela Presidente do Conselho de
Administração só pode ser atribuído à cegueira deliberada, na
melhor das hipóteses, está-se diante de omissão dolosa. A
denunciada, se verdade fosse seu desconhecimento, omitiu-se em suas
responsabilidades, e o fez de forma dolosa.
Vale lembrar que grande parte dos
desvios foi direcionado a seu Partido Político, beneficiando-a
diretamente, inclusive em suas eleições presidenciais.
Aliás, o encaminhamento de
dinheiro da corrupção para a campanha eleitoral da denunciada em
2010 e para o Partido dos Trabalhadores – PT, agremiação
partidária esta que sustentou e sustenta politicamente a denunciada,
é fato já confirmado na Operação Lava Jato.
Quanto às eleições de 2014,
seu benefício com a doação ao PT e a partidos aliados de dinheiros
oriundos de corrupção, entre os anos de 2011 e 2013, também já
confessados, torna incontroverso que a própria reeleição da
denunciada foi contaminada.
Ora, não saber, a Presidente da
República, que vultosas quantias em dinheiro foram desviadas dos
cofres públicos do Governo Federal e que parte significativa desses
recursos fora diretamente para as contas de seu partido é decorrente
de sua omissão em cumprir com seus deveres mínimos de gestora e de
candidata responsável por sua arrecadação e despesa de campanha.
E, ante os fatos que já se encontravam conhecidos no transcorrer dos
últimos anos, sua omissão é, a toda evidência, dolosa.
Data vênia, cada vez que a
denunciada diz que não sabia o que estava acontecendo em seu Governo
ela brinca com a boa-fé do cidadão brasileiro!
Aliás, em entrevista concedida
no ano de 2009, época em que ainda ocupava o cargo de Ministra-Chefe
da Casa Civil, conforme faz prova inclusa mídia com o respectivo
vídeo, a denunciada comprova conhecer profundamente a contabilidade
da Petrobrás, quando afirmou:
“A
Petrobrás de hoje é uma empresa com nível de contabilidade dos
mais apurados do mundo”
Ora, se seu conhecimento sobre a
Petrobrás era tão profundo, a ponto de poder afirmar o grau de
apuração de sua contabilidade, a toda evidência que não tem como
negar aquilo que se passava em contratos realizados pela Petrobrás,
contratos esses que, aliás, como conselheira da Petrobrás, aprovou,
concordando assim com os valores superfaturados!
Não é admissível que alguém,
que tem o conhecimento da contabilidade de uma empresa como a da
Petrobrás, não saiba avaliar, na qualidade de conselheira, a
existência de superfaturamento em contratos que aprova!
Desde o ano de 2005, quando o
Brasil, atônito, assistiu à gravação de corrupção nos Correios
mediante a entrega de R$ 3.000,00 (três mil reais) a Maurício
Marinho, por um empresário interessado em participar de uma
licitação desta empresa pública, as revelações de atos de
corrupção e desvio de recursos públicos se amontoam no Governo do
Partido dos Trabalhadores.
O que começou com alguns poucos
milhares foi se avolumando passando rapidamente para dezenas de
milhões, centenas de milhões e, hoje, falamos em bilhões. Após 10
(dez) anos de sucessivos e incansáveis escândalos, perdemos a
capacidade de analisar o efetivo custo da corrupção no Brasil. É
preciso entender que os valores comprovados de corrupção no país
atingem cifras inimagináveis!
São bilhões de reais que
deixaram os cofres públicos apenas na Petrobrás, para beneficiar
poucos.
O montante de recursos envolvidos
é estarrecedor, o que, repita-se, impede admitir o desconhecimento
de quem esteve no centro da gestão pública da Petrobrás, mais uma
vez evidenciando-se, no mínimo, a omissão dolosa da denunciada.
Saliente-se que a omissão como
hipótese caracterizadora de crime de responsabilidade e, portanto,
fundamento para o impeachment não é nenhuma novidade, pois foi
justamente a grave omissão do ex-Presidente da República Fernando
Collor de Mello um dos fatos que ensejaram seu impedimento. Neste
sentido, vejamos o seguinte trecho do relatório do então Deputado
Federal Nelson Jobim, relator do processo de cassação de Collor na
Câmara dos Deputados, que afirmou:
“V
– GRAVE OMISSÃO
Por
último, a Denúncia atribui ao Senhor Presidente da República
“diante do recebimento injustificado de vultosas quantias por meio
de correntistas ‘fantasmas’, e diante do fato notório do tráfico
de influência exercido por Paulo César Farias (Fls. 15, 1º
Parágrafo), grave omissão “permitindo tácita ou expressamente
infração à lei federal de ordem pública” (fls. 16, último
parágrafo), consistentes nos arts. 5, incisos I e VIII, da Lei nº
8.027/90, e incisos IX e XII do art. 117 da Lei nº 8;112/90, como,
também, e leis penais, administrativas e tributárias (fls. 17,
último parágrafo).
Estes
são os elementos de fato, carreados do Relatório da Comissão
Parlamentar de Inquérito, que fundamentam a Proposta Acusatória.
Termina
a Denúncia por requerer, como pedido, que, admitida nessa Câmara de
Deputados a acusação... formulada, seja a mesma remetida ao Senador
Federal, onde será julgada, o reconhecimento de sua procedência,
para aplicar ao denunciado a pena de perda do cargo, com
inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública,
sem prejuízo do procedimento penal competente... (fls. 19).
Instruem
a Denúncia o Relatório Final da Comissão Mista Parlamentar de
Inquérito, os pronunciamentos do denunciado dos dia 30 de junho e 30
de agosto deste ano, acompanhado de outros documentos, requerendo,
por fim, a tomada de depoimento de seis testemunhas e a requisição
de cópias de inteiro teor dos autos da CPI e de todas as peças do
inquérito instaurado pela Polícia Federal (fls. 20).”
Aqui, estamos diante, no mínimo,
de quadro ainda mais grave de omissão da Presidente da República!
Se
alguns perderam a capacidade de se indignar diante desta afronta à
própria democracia brasileira, a maior parte da sociedade não
perdeu, tanto que pesquisa da Folha de São Paulo revela que 63%
(sessenta e três por cento) dos brasileiros quer o impeachment da
denunciada. Isso sem contar as assinaturas colhidas pela plataforma
www.proimpeachment.com.
Caso realmente estivesse
inocente, caberia à denunciada, afastar as pessoas supostamente
envolvidas nos atos de corrupção e não as manter e até defender,
negando os fatos. O comportamento da Presidente, infelizmente, não
condiz com a honorabilidade do cargo.
“Embora
não haja faltado quem alegasse que eleição popular tem a virtude
de apagar as faltas pretéritas, a verdade é que infrações
cometidas antes da investidura no cargo, estranhas ao seu exercício
ou relacionadas com anterior desempenho, têm motivado o impeachment,
desde que a autoridade seja reinvestida em função suscetível de
acusação parlamentar. Estas dimensões, atribuídas ao impeachment,
pela doutrina e experiência americanas, condizentes, aliás, com as
características do instituto, não as ignora a literatura
brasileira. Maximiliano, a propósito, doutrinou: ‘só se processa
perante o Senado quem ainda é funcionário, embora as faltas tenham
sido cometidas no exercício de mandato anterior’... Enfim, se
infrações recentes ou antigas podem motivar a apuração da
responsabilidade, a pena não vai além da destituição do cargo,
com inabilitação para o exercício de outro...” (Paulo Brossard.
O Impeachment. São Paulo: Saraiva, 3ª. ed. 1992. p. 137).
Merece destaque a possibilidade
de a denunciada responder por atos praticados em mandato anterior.
Embora já esteja evidenciado que os fatos que subsidiam este pedido
também ocorreram no início deste mandato, a questão jurídica
referente ao tema há de ser enfrentada.
O instituto da reeleição
estabelece ao mandatário reeleito a continuidade de gestão, de modo
que os atos praticados no primeiro mandato surtem efeitos diretos à
responsabilidade do Presidente da República ainda ocupando o mesmo
cargo público.
O fundamento desta
responsabilidade continuada decorre, justamente, do fato de que a
reeleição é, em verdade, uma continuidade administrativa,
mantendo-se o vínculo entre as legislaturas. Nesse sentido;
“A
reelegibilidade, como bem asseverado pelo Ministro Carlos Velloso,
assenta-se em um postulado de continuidade administrativa. ‘É
dizer – nas palavras do Ministro Carlos Velloso – a permissão da
reeleição do Chefe do Executivo, nos seus diversos graus,
assenta-se na presunção de que a continuidade administrativa, de
regra, é necessária” (ADI-MC 1.805, acima referida).” (MENDES,
Gilmar Ferreira. o. c., pg. 732).
Ora, se a reeleição é uma
continuidade, só há que se falar em continuidade quando há o que
se continuar. Portanto, para o candidato reeleito, o segundo mandato
é, nada mais nada menos, que o prolongamento do primeiro mandato,
tornando-se, ao final do período, uma só administração.
Tal assertiva já foi objeto de
análise pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento de
mandato de segurança impetrado por parlamentar que, objetivando não
responder por processo no Conselho de Ética, por quebra de decoro
parlamentar, sustentou a tese de que práticas realizadas em mandato
anterior não poderiam ser objeto de processo disciplinar no mandato
seguinte. Assim se decidiu no caso:
“A
cristalizar-se o entendimento de que determinada legislatura não
pode conhecer de fatos ocorridos na anterior, estaremos estabelecendo
período de verdadeiro vale-tudo nos últimos meses de todas as
legislaturas. Se restarem provados os fatos a ele imputados, deverá
esta Casa agir, lançando mão dos princípios constitucionais
colocados à sua disposição (quais sejam, o da razoabilidade e o da
máxima efetividade das normas constitucionais), além de valer-se
dos princípios que lastreiam o sistema jurídico nacional para
emitir juízo político, declarando a perda do cargo de Deputado
Federal, por parte do representado”. (STF - Mandado de Segurança
nº 23.388 – Rel. Min. Néri da Silveira – j. 25.11.1999 – DJ
de 20.4.2001)
É interessante notar que o
trecho em destaque do voto proferido pelo ilustre Ministro do STF
Néri da Silveira é a reprodução de texto do voto proferido pelo
relator do processo de cassação, por quebra de decoro parlamentar,
do ex-Deputado Federal Talvane Albuquerque. Com isto, constata-se que
não só o Supremo Tribunal Federal reconhece a possibilidade de se
cassar mandato eletivo por prática ocorrida em mandato anterior,
como também já é a jurisprudência da Câmara dos Deputados.
Este mesmo entendimento foi
reafirmado pelo Supremo Tribunal Federal no seguinte precedente do
ex-Deputado Pinheiro Landim:
“Tenho
para mim, ao examinar, em sede de estrita delibação, a pretensão
mandamental deduzida pelo ora impetrante - não obstante as razões
tão excelentemente desenvolvidas por seus eminentes Advogados - que
tal postulação parece não se revestir de plausibilidade jurídica,
especialmente em face da existência de decisão plenária, proferida
pelo Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do MS 23.388/DF,
Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, ocasião em que esta Suprema Corte,
tendo presente situação virtualmente idêntica à que ora se
registra neste processo ("Caso Talvane Neto"), rejeitou a
tese de que a Casa legislativa não pode decretar a cassação de
mandato de qualquer de seus membros, por falta de decoro parlamentar,
se o fato motivador dessa deliberação houver ocorrido na
legislatura anterior.
Essa decisão,
emanada do Plenário do Supremo Tribunal Federal, acha-se
consubstanciada em acórdão assim ementado:
"Mandado
de segurança. 2. Ato da Mesa da Câmara dos Deputados, confirmado
pela Comissão de Constituição e Justiça e Redação da referida
Casa legislativa, sobre a cassação do mandato do impetrante, por
comportamento incompatível com o decoro parlamentar.
3.
Pretende-se a extinção do procedimento de perda do mandato.
Sustenta-se que a cassação do mandato, para nova legislatura, fica
restrita à hipótese de, no curso dessa legislatura, se verificarem
condutas, dela contemporâneas, capituláveis como atentatórias do
decoro parlamentar. 4. Não configurada a relevância dos fundamentos
da impetração. Liminar indeferida. 5. Parecer da Procuradoria-Geral
da República pela prejudicialidade do mandado de segurança, em face
da perda de objeto; no mérito, pela denegação da ordem. 6. Tese
invocada, acerca da inexistência de contemporaneidade entre o fato
típico e a competência da atual legislatura, que se rejeita. 7. Não
há reexaminar, em mandado de segurança, fatos e provas (...). 9.
Mandado de Segurança indeferido."
Cabe
destacar, neste ponto, que o princípio da unidade de legislatura -
que faz cessar, a partir de cada novo quadriênio, todos os assuntos
iniciados no período imediatamente anterior, dissolvendo-se, desse
modo, todos os vínculos com a legislatura precedente (JOSÉ AFONSO
DA SILVA, "Princípios do Processo de Formação das Leis no
Direito Constitucional", p. 38/39, item n. 14, 1964, RT) - rege,
essencialmente, o processo de elaboração legislativa, tanto que,
encerrado o período quadrienal a que se refere o art. 44, parágrafo
único, da Constituição Federal, dar-se-á, na Câmara dos
Deputados, o arquivamento das proposições legislativas, com a só
exceção de alguns projetos taxativamente relacionados na norma
regimental (Regimento Interno da Câmara dos Deputados, art. 105).
É
por essa razão que o eminente Professor JOSÉ AFONSO DA SILVA, ao
tratar do postulado da unidade de legislatura, examina-o dentre os
princípios que informam o processo constitucional de formação das
leis.
De
outro lado, e ao contrário da limitação de ordem temporal imposta
à atividade investigatória das Comissões Parlamentares de
Inquérito - cujo âmbito de atuação não pode ultrapassar a
legislatura em que instauradas (HC 71.193/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA
PERTENCE - MS 22.858/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO) -, cumpre
rememorar que o Supremo Tribunal Federal, como precedentemente
assinalado, já firmou orientação no sentido de que o princípio
da unidade de legislatura não se reveste de efeito preclusivo, em
tema de cassação de mandato legislativo, por falta de decoro
parlamentar, ainda que por fatos ocorridos em legislatura anterior
(MS 23.388/DF, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, Pleno).
Isso
significa, portanto, que o princípio da unidade de legislatura não
representa obstáculo constitucional a que as Casas legislativas
venham, ainda que por fatos anteriores à legislatura em curso, a
instaurar - contra quem já era titular de mandato na legislatura
precedente - procedimento de caráter político-administrativo,
destinado a viabilizar a decretação da perda do mandato, por fato
atentatório ao decoro parlamentar, cometido por quem então se
achava investido na condição de membro de qualquer das Casas do
Congresso Nacional (CF, art. 55, I, "e", §§ 1º e 2º).”
(STF – MS 24.458 – Rel. Min. Celso de Melo – j. 18.02.2003 –
DJ de 12.03.2003)
Deste v. acórdão, merece
destaque, ainda, a seguinte passagem do brilhante voto do Ministro
Celso de Melo:
“O
sistema democrático e o modelo republicano não admitem, nem podem
tolerar a existência de regimes de governo sem a correspondente
noção de fiscalização e de responsabilidade.
Nenhum
membro de qualquer instituição da República está acima da
Constituição, nem pode pretender-se excluído da crítica social ou
do alcance da fiscalização da coletividade.” (STF, MS 24.458,
Rel. Min. Celso de Melo, acima citado.)
Decorre destas razões de decidir
que a rejeição à comunicação entre as ilegalidades praticadas em
um mandato e a responsabilidade no mandato ulterior do reeleito vai
de encontro ao princípio republicano, o que se aplica para quaisquer
dos poderes constituídos, pois nenhum deles está alheio à noção
de fiscalização e de responsabilidade. Como diz o Ministro Relator,
“nenhum membro de qualquer instituição da República está acima
da Constituição”.
A verdade é que a tese defendida
e amplamente divulgada pelos defensores da denunciada não possui
qualquer embasamento jurídico. Não há como admitir que teses
infundadas se tornem efetivas apenas por serem repetidas.
Não há no ordenamento jurídico
qualquer norma ou decisão que respalde a tese de que a quebra de uma
legislatura significa um apagar de responsabilidades. Este
entendimento fere o direito, fere a Constituição da República, que
tem na responsabilidade do gestor público um de seus principais
alicerces, como já demonstrado acima.
Aliás, o Supremo Tribunal
Federal, nos autos do Recurso Extraordinário nº 344.882-0, já
decidiu que a criação do instituto da reeleição fez com que a
interpretação da Constituição, nos tópicos que guardem relação
com a temática que lhe é própria, mereça um reexame, de forma a
preservar uma unicidade sistemática da Carta Magna.
Neste caso, por força da
reeleição, reinterpretou-se o art. 14, §§ 5º e 7º da CF para
admitir a candidatura de cônjuge e parentes de Chefes do Poder
Executivo que exerceu apenas um mandato.
Mutatis mutandis, com a vigência
da reeleição, o crime de responsabilidade também é afetado para
responsabilizar o administrador durante todo o período de seus
mandatos, de forma a preservar a unicidade das normas
constitucionais, notadamente o princípio da moralidade pública.
Assim, quer em razão dos crimes
de responsabilidade ocorridos no início deste segundo mandato, quer
pelo caráter de continuidade do segundo mandato do Chefe do
Executivo reeleito, quer pela continuidade das ilegalidades no início
desta legislatura, a responsabilidade da denunciada pelos fatos aqui
narrados é incontroversa.
Advogados ligados ao Partido dos
Trabalhadores têm sustentado que a Constituição Federal vedaria
responsabilizar a Presidente por crimes praticados no mandato
anterior, por prever que o presidente não pode ser responsabilizado
por ato alheio as suas funções. Ora, francamente, não há um
dicionário sequer em que a palavra função possa ser tomada como
sinônimo de mandato!
Em
parecer apresentado ao Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP),
o Eminente Jurista Adilson Abreu Dallari, quando questionado se “na
hipótese de reeleição do Presidente da República para mandato
subsequente, pode haver responsabilização por ato praticado no
exercício da função em mandato anterior?” respondeu
categoricamente: “Sim. No caso de reeleição, o Presidente da
República estará no exercício das funções, inerentes ao cargo,
pelo período de oito anos, e pode ser responsabilizado por atos e
omissões que configurem crime de responsabilidade, ocorridos durante
todo esse período. A norma constitucional superveniente,
possibilitando o alargamento do período de exercício das funções
inerentes ao cargo, determina que a interpretação de normas,
anteriormente existentes, instituindo a responsabilidade com regra
ampla e geral, seja feita de maneira evolutiva, em conformidade com
os princípios fundamentais da Constituição Federal”4.
Ainda
que indiretamente, também o Eminente Jurista Ives Gandra Martins
respondeu sim a este questionamento, na medida em que foi o primeiro
a publicamente sustentar a possibilidade e até a necessidade de
cassar-se o mandato da Presidente da República. E especificamente
sobre o tema, aduziu:
“Parece-me,
pois, que não se trata, no que diz respeito ao novo mandato, em que
se mantém a mesma direção continuada da instituição do 1º
mandato, se não de um mandato continuado, o que levaria a
possibilidade de considerar crime continuado contra a probidade da
administração, por falta das medidas necessárias de afastamento
imediato de quem dirigiu a estatal em setores estratégicos e agora
na presidência da empresa, durante o período de assalto a estatal
(Presidente Lula e Presidente Dilma)”5.
Em
maio de 2015, no Jornal do Advogado de São Paulo, Janaina Conceição
Paschoal, subscritora da presente, também respondeu sim, ao
participar de debate referente ao cabimento de impeachment,
por crime praticado no mandato anterior6.
Mais recentemente, o professor associado de Direito Processual Penal
na USP, Gustavo Badaró, corroborou este entendimento7.
Devendo-se mencionar que há várias publicações do Professor
Dirceo Torrecillas Ramos, no mesmo sentido.
A
esta altura, portanto, parece superada a exegese de que a reeleição
constituiria verdadeira anistia aos crimes perpetrados no primeiro
mandato, muitos dos quais, há que se dizer, intentados com o fim de
garantir a reeleição. Importante deixar bem claro que esta
convicção não se deve apenas a uma vontade política, decorrendo
da análise sistemática da ordem jurídica. Vejamos.
A
Constituição Federal, em seu artigo 85, diz que compete à lei
federal disciplinar os crimes de responsabilidade do Presidente da
República, inclusive no que concerne ao processo de Impeachment
e a seu julgamento. Esses crimes são previstos na Lei 1.079/50, que
foi recepcionada pela Constituição Federal de 88; tanto que sofreu
posteriores alterações por parte da Lei 10.028/2000.
Em
seu artigo 15, a Lei 1.079/50 estatui que “a denúncia só
poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por qualquer
motivo, deixado definitivamente o cargo”.
Em
virtude da possibilidade de reeleição, houve manifestações no
sentido de que referido dispositivo impediria a perda do segundo
mandato, em decorrência de crime de responsabilidade praticado
durante o primeiro.
No
entanto, impossível conferir tamanha amplitude para o artigo 15 da
Lei 1.079/50. Referido dispositivo constitui apenas uma condição de
procedibilidade, como resta cristalino no acórdão prolatado pelo
Egrégio Supremo Tribunal Federal, no Mandado de Segurança n.
21.689/DF, impetrado em benefício do ex-Presidente Collor.
Com
efeito, na medida em que o fim primordial do processo de Impeachment
é a perda do cargo, a ação somente terá legitimidade para se
iniciar, na hipótese de o imputado estar no cargo a ser perdido. Daí
a exigência de que não o tenha deixado definitivamente.
Poder-se-ia
pretender objetar, aduzindo que, na verdade, o artigo 15 implicaria
uma condição de punibilidade, uma vez que está diretamente
relacionado à possibilidade de punição para o crime de
responsabilidade. No entanto, uma vez recebida a denúncia, se o
acusado renunciar, objetivando se eximir do processo, tem-se que,
conforme ocorrera com o ex-Presidente Fernando Collor de Mello, o
feito terá seguimento, para a aplicação da sanção de
inabilitação para função pública.
Nota-se,
portanto, que a exigência de que o acusado esteja no cargo para a
recepção da denúncia funciona como a representação, nos crimes
de ação penal pública condicionada; ou seja, condição de
procedibilidade.
Cumpre
lembrar que, por não estar obrigado a se desincompatibilizar para
concorrer à reeleição, a bem da verdade, o Presidente da
República, sendo reeleito, nunca terá deixado definitivamente o
cargo. Tanto é assim que, durante a campanha, em regra, é tratado
como Presidente/candidato, participando de eventos de campanha e de
compromissos oficiais. Esse é exatamente o caso da Presidente Dilma
Rousseff, ora denunciada, que não se licenciou do cargo de
Presidente por nenhum dia sequer. Em outras palavras, desde que
eleita para seu primeiro mandato, a denunciada jamais deixou
definitivamente o cargo.
Em
suma, desde a posse no primeiro mandato, não houve um só momento em
que o país tenha ficado sem sua Presidente. Não se pode, portanto,
alegar impossibilidade de Impeachment, por ter a denunciada deixado
definitivamente o cargo.
Resta
também imperioso que se tenha nítido que, em nenhuma medida,
considerar a possibilidade de Impeachment representa golpe. Muito ao
contrário, o que uma verdadeira República não pode admitir é que
o governante lance mão de todo tipo de desmando, até com o fim de
garantir sua reeleição, ficando blindado à devida ação dos
demais poderes.
Ao concorrer à reeleição, o
Presidente da República detém a máquina estatal e, nem sempre,
seus crimes de responsabilidade são conhecidos antes do pleito
eleitoral. Não é raro que tais crimes venham a ser desvendados
apenas no decorrer do segundo mandato. Inconstitucional é negar aos
representantes de um povo enganado o poder/dever de zelar pelo bom
exercício do Poder Executivo.
Nesse sentido, resta
absolutamente pertinente recorrer às lições do Constitucionalista
José Afonso da Silva que, em artigo recentemente publicado,
consignou que a perda da legitimidade da atual Presidente da
República é inegável, sendo certo que, independentemente da
ideologia adotada, o atual estado de coisas não pode persistir. Em
suas ponderações, o Eminente Jurista até admitiu que as
alternativas disponíveis não são alvissareiras; entretanto, deixar
de tomar as medidas cabíveis e necessárias não ajudará a acomodar
a situação8.
É bem verdade que vários
formadores de opinião têm insistido no pleito de que a Presidente
da República, ora denunciada, renuncie, até com o objetivo de não
vitimar, ainda mais, a República. Compreendem-se as razões desses
intelectuais; porém, a nação não pode esperar. O histórico antes
narrado e a sucessão de fatos escabrosos que se desvelam indicam que
a denunciada não está disposta a abandonar o poder, para cuja
manutenção disse que faria o que fosse preciso.
É imperioso, portanto, fazer
cumprir a Constituição Federal, a lei vigente e os princípios
norteadores de uma verdadeira República. A Presidente está no
cargo. Desde que o assumiu, em 2011, jamais o deixou, ainda que
provisoriamente. Não existem óbices para o recebimento desta
denúncia. Em nenhuma norma está escrito que não cabe Impeachment,
por crime de responsabilidade perpetrado no mandato anterior.
De todo modo, não resta
excessivo lembrar que, muito embora a grande maioria dos atos
criminosos tenha ocorrido no primeiro mandato, já no curso do
segundo mandato, houve desrespeito para com a Lei de Responsabilidade
Fiscal, mediante a prática das chamadas pedaladas fiscais; sendo
certo que, por um bom tempo, a denunciada insistiu em defender e
manter a diretoria da Petrobrás, apegando-se à tese, sempre
revisitada, de perseguição.
No que tange aos descalabros na
Petrobrás, a continuidade delitiva resta muito evidenciada nas
fortes manifestações dos Ministros do Supremo Tribunal Federal,
Celso de Mello e Carmen Lúcia, quando do julgamento de Habeas Corpus
impetrado em benefício de um dos imputados na Lava Jato. Na
oportunidade, os Ministros, mostrando-se impressionados, apontaram
verdadeira “delinquência institucional”!9.
Não só não há óbices ao
recebimento desta denúncia, como a autorização para que a
Presidente seja processada com o fim de ter seu mandato cassado é de
rigor!
O que os denunciantes rogam a
esta Casa é que considere toda esta continuidade delitiva, para
autorizar seja a Presidente da República processada por seus crimes
de responsabilidade.
4. Do Pedido:
Os ora denunciantes, por óbvio,
prefeririam que a Presidente da República tivesse condições de
levar seu mandato a termo. No entanto, a situação se revela tão
drástica e o comportamento da Chefe da nação se revela tão
inadmissível, que alternativa não resta além de pedir a esta
Câmara dos Deputados que autorize seja ela processada pelos crimes
de responsabilidade previstos no artigo 85, incisos V, VI e VII, da
Constituição Federal; nos artigos 4º., incisos V e VI; 9º.
números 3 e 7; 10 números 6, 7, 8 e 9; e 11, número 3, da Lei
1.079/1950.
Alguns analistas têm advertido
que o processo de Impeachment seria muito custoso à nação. Não há
dúvida de que será. No entanto, a sanha de poder que orienta o
grupo da denunciada, a qual se torna mais clara a cada dia,
certamente se revela ainda mais deletéria.
Imperioso, por outro lado,
lembrar que o processo de Impeachment tem previsão constitucional e
os remédios, por mais que tenham efeitos colaterais, devem ser
ministrados, quando necessários e cabíveis. No caso de que ora se
trata, esta Egrégia Casa tem a missão de resgatar a legalidade,
como, aliás, já fizera, sem nenhuma consequência deletéria à
nação.
A corrupção, a não
observância de promessas, a ideia de que o público, no lugar de ser
de todos, não é de ninguém, infelizmente, sempre permeou a
mentalidade nacional, como ensina a Professora Denise Ramos .
No entanto, nestes últimos anos,
o sentimento de que, no Brasil, toda sorte de desfaçatez é
permitida popularizou-se. Tanto é assim que ex-detentores de cargos
públicos, e até mesmo atuais detentores de cargos públicos, não
têm nenhum pudor em dizer que recebem milhões a título de
consultoria.
A moralidade precisa ser
resgatada para que o cidadão que paga seus impostos, que luta para
educar e alimentar seus filhos, não sinta vergonha de ser
brasileiro.
“De
pouco valerá falar ao menino em reverência, justiça, probidade,
veracidade, se essas leis se não praticarem diante dele: é
unicamente por atos que lhas ensinaremos a conhecer.” (Rui Barbosa.
Migalhas de Rui Barbosa – org. Miguel Matos).
No teatro sem fim em que vivem
engendrados a Presidente da República e seus consortes, insiste-se
que apenas a elite está descontente, supostamente com a elevação
das classes menos favorecidas.
Trata-se de mais uma falácia. A
população, cansada, indignada, mas ainda esperançosa na devida
separação dos poderes, tem saído às ruas, para pedir o básico:
observância à lei e à Constituição Federal; como ocorrera,
aliás, em 1992, quando Barbosa Lima Sobrinho e Marcelo Lavenère
pleiteram o Impeachment do então Presidente Fernando Collor de Mello.
Somos negros e brancos, jovens e
idosos, homens e mulheres de várias orientações sexuais,
nordestinos e sulistas, somos brasileiros querendo resgatar a honra
que ainda resta para este país. Os tiranos que dele se apoderaram
construíram um discurso de cisão, objetivando nos enfraquecer, para
se perpetuarem. A simples adoção de tal discurso já denotaria a
inadmissível imprudência denunciada por Aristóteles, em sua
célebre obra A Política (Bauru: EDIPRO, 1995. p. 94); porém todos
os atos, recentemente trazidos à luz, levam à convicção de que
houve crimes de responsabilidade de várias ordens.
À Câmara dos Deputados Federais
rogamos que coloque um fim nesta situação, autorizando que a
Presidente da República seja processada pelos delitos perpetrados,
encaminhando-se, por conseguinte, os autos ao Senado Federal, onde
será julgada para, ao final, ser condenada à perda do mandato, bem
como à inabilitação para exercer cargo público pelo prazo de oito
anos, nos termos do artigo 52, parágrafo único, da Constituição
Federal. É o que ora se requer! E não só os denunciantes que assim
solicitam, representantes de 45 (quarenta e cinco) movimentos sociais
subscrevem esta denúncia.
A presente denúncia segue
instruída com notícias jornalísticas, pareceres, representação e
acórdãos, antes mencionados. Os fatos são de conhecimento notório,
de forma que os denunciantes entendem serem suficientes à
deflagração do processo de Impeachment.
No entanto, caso V. Exa. pense de
modo diverso, em nome da verdade real, que deve ser buscada em prol
do país, desde logo, postula-se sejam notificados o TSE, o STF, o
TRF da 4ª. Região e a 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba-PR,
para que enviem a íntegra dos procedimentos referentes,
respectivamente, às contas de campanha da denunciada e à Operação
Lava Jato.
Postula-se, ainda que seja
expedido ofício ao Tribunal de Contas da União para que apresente
cópia de processos, procedimentos, pareceres, estudos, auditorias ou
qualquer outra informação em que constem elementos que digam
respeito a investigações, constatações ou qualquer outra prova
referente à prática de irregularidades pelo Governo Federal, no ano
de 2015, que digam respeito às ilegalidades constatadas por aquele
Tribunal auxiliar do Poder Legislativo nos autos do TC
021.643/2014-8; bem como que sejam oficiados o Banco do Brasil, a
Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social para que informem os valores adiantados pela
própria instituição concernente à execução de programas do
Governo Federal no ano de 2015 e os montantes repassados pelo Tesouro
Nacional para cobertura desses mesmos valores, também no ano de
2015. A informação deverá conter a evolução dos valores mês a
mês, devendo informar, quanto aos valores recebidos, se os
pagamentos são concernentes a adiantamentos havidos no ano de 2015
ou a dívidas consolidadas no ano de 2014; Seja oficiada a União
para que informe o montante executado por instituições financeiras,
referentes aos benefícios especificados nesta denúncia, em seu
todo, no ano de 2015, e quais os valores repassados para essas mesmas
instituições pelo Tesouro Nacional, especificando os valores, mês
a mês, e por benefício.
Por certo, os documentos são
suficientes a instruir o feito; porém, na eventualidade de a Câmara
e o Senado entenderem pela necessidade de ouvir testemunhas, desde
logo, arrolam-se aquelas cuja colaboração fora essencial para o
desvendar de toda essa terrível situação, em especial: 1) Alberto
Youssef; 2) Ricardo Pessoa; 3) o Representante do Ministério Público
junto ao TCU, Dr. Júlio Marcelo de Oliveira; 4) o Auditor Fiscal
Antônio Carlos Costa D’ Ávila Carvalho (Mat. 5715-0); e 5) o
Auditor Fiscal Charles Santana de Castro (Mat. 9432-3).
Por derradeiro, cumpre lembrar
frase central em nosso Hino Nacional: VERÁS QUE UM FILHO TEU NÃO
FOGE A LUTA! Munidos da Constituição Federal, estes filhos do
Brasil vêm pedir ao Congresso Nacional que tenha a CORAGEM
necessária para fazer a devida JUSTIÇA!
Brasil, 15 de outubro de 2015.
HÉLIO PEREIRA BICUDO MIGUEL
REALE JUNIOR
JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL
Flávio Henrique Costa Pereira
OAB/SP 131.364
De Acordo:
Carla Zambelli Salgado,
por 43 Movimentos Contra a Corrupção
Kim
Patroca Kataguiri, pelo Movimento Brasil Livre
Rogério
Chequer, Vem
Pra Rua
1
http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2015/07/21/628-sao-favoraveis-ao-impeachment-de-dilma-diz-pesquisa.htm
2
Art.
167, V da CF: “Art. 167. São
vedados: I - ......; (...); V – a abertura de crédito suplementar
ou especial sem prévia autorização legislativa e sem indicação
dos recursos correspondentes;”
3
Art.
4o Fica autorizada a abertura de créditos suplementares, restritos
aos valores constantes desta Lei, excluídas as alterações
decorrentes de créditos adicionais, desde que as alterações
promovidas na programação orçamentária sejam compatíveis com a
obtenção da meta de resultado primário estabelecida para o
exercício de 2014 e sejam observados o disposto no parágrafo único
do art. 8º da LRF e os limites e as condições estabelecidos neste
artigo, vedado o cancelamento de quaisquer valores incluídos ou
acrescidos em decorrência da aprovação de emendas individuais
apresentadas por parlamentares, para o atendimento de despesas:
4
- disponível
em:
http://s.conjur.com.br/dl/parecer-iasp-adilson-dallari-possivel.pdf
6
- disponível em:
http://www.hkl.com.br/oab_flip/default_novo.asp
9
-
http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,delinquenciainstitucional,1747326
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Imagem disponível em: www.tribunadainternet.com.br |
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